quarta-feira, junho 22, 2011

TEREZA


BATISTA


CANSADA


DE


GUERRA



Episódio Nº 133




Sem a disenteria, o crupe, o tétano, a fome propriamente dita, já se imaginou o mundo de crianças a crescer, a virar adultos, alugados, trabalhadores, meeiros, imensos batalhões de cangaceiros – não esses ralos bandos de jagunços se acabando nas estradas ao som das buzinas dos caminhões – a tomar as terras e a dividi-las? Pestes necessárias e beneméritas, sem elas seria impossível a indústria das secas tão rendosa; sem elas como manter a sociedade constituída e conter o povo, de todas as pragas a pior? Imagine, meu velho, essa gente com saúde e sabendo ler, que perigo medonho!

D

Dali, dos abrigados cómodos nas margens de São Francisco, nas gargantas de pedras de Piranhas, saiu a bexiga, embarcou em Propriá, desceu em Buquim. Para experimentar armas e não perder tempo, inoculou-se no foguista e no maquinista, mas o fez devagar, dando-lhes tempo para morrerem na Bahia, com alarmantes notícias nos jornais. Dias depois, telegramas do sertão, transformavam-se em manchetes de sete colunas nas primeiras páginas: a varíola ataca outra vez.

Porque veio e assim violenta? Saber com exactidão e provas, não se soube jamais. A oposição atribuiu o surto maligno às comemorações acintosas, provocativas. Embora devendo-se escutar afirmações políticas (ademais oposicionistas) com ouvido céptico, com natural reserva, sem lhes atribuir grande crédito, dando-lhes o desconto devido, em todo o caso aqui se regista, nestas trovas onde se narra a memorável peleja, a versão referente aos festejos. Além dela, nada se sabe de outra explicação válida – a não ser a da ausência de qualquer real medida preventiva, do descaso das autoridades da saúde pública, da falta de atenção ao problema das endemias e epidemias rurais, engolidas as verbas por quem de direito, mas essa versão já foi desmentida pelos órgãos competentes.

Os festejos destinavam-se exactamente a aplaudir e demonstrar a gratidão geral pela anunciada erradicação da varíola, da malária, do tifo, da febre amarela, da lepra e de pestes menores, aproveitando-se para tais festividades a estada em Buquim do ilustríssimo director de Saúde Pública do Estado e de sua alegre caravana (de burgo em burgo, visitando os postes de saúde e papando aqueles banquetes).

Banquetes, foguetórios, marciais bandas de música, discursos e mais discursos a martelarem o propalado saneamento da região, antes reduto da bexiga, agora, segundo os comunicados municipais, até o alastrim de manso matar desaparecera das feiras, das estradas dos cantos de rua, dos becos escusos. Para sempre varridas do sertão a varíola, a malária, o tifo, pestes todas elas endémicas nos governos anteriores, como é do conhecimento de todos. Viva nosso bem-amado governador-geral, infatigável defensor da saúde do povo, viva, vivô!

Viva o benquisto director da Saúde Pública, fulgurante talento dedicado ao bem-estar dos caros coestaduanos e viva por último o perfeito da cidade, o advogado Rogério Caldas, de todos quem menos comeu da verba destinada à luta contra as endemias rurais, pois ratos maiores e mais bem situados a foram devorando ao longo do processo burocrático, no caminho da capital ao interior – ainda assim sobrava apreciável parcela para o zeloso administrador. (clik na imagem e aumente)

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