TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 143
L
Lei é promulgada para ser obedecida – lei, regulamento, horário. O horário do posto de saúde estava afixado no portão, bem à vista: das nove da manhã ao meio-dia, das duas às cinco da tarde. Teoricamente, pois tanto Maximiano como Juraci não apreciam interrupções durante o tempo dedicado ao estudo e à preparação da lista do jogo do bicho pelo primeiro, à redacção de diárias e comoventes cartas para o noivo pela segunda, tempo sagrado.
Quanto ao doutor não cumpre horário rígido, aparecendo quando melhor lhe dá na gana, pela manhã ou à tarde mas sempre com pressa; houvesse assunto de muita urgência e bastaria a enfermeira ou o vigia atravessar a rua – situando-se a residência do médico defronte ao posto – e chamá-lo tirando-o quase sempre da cama onde, se não estava a botar em Tereza, dormia a sono solto, esquecido inclusivamente das ambições políticas, dos projectos de organizar núcleo no município.
Zacarias, farto de bater palmas, de gritar ó de casa! Soqueia a porta com as duas mãos fechadas. Ausente da cidade o farmacêutico Tesoura, de viagem em Aracaju, doutor Evaldo em casa de um doente, sobrava-lhe o posto de saúde, o mediquinho moderno. Zacarias, o peito tomado de medo, ameaça arrombar a porta. Um homem surge na esquina, apressa a marcha, posta-se ante o trabalhador:
- Que é que quer?
- O senhor trabalha aqui?
- Trabalho, sim, e daí?
- Cadê o doutor?
- E o que é que você quer com o doutor?
- Quero que ele me receite.
- A esta hora? Está maluco? Não sabe ler? Olhe o horário aí, das…
- Vosmicê pensa que doença tem hora?
A voz rouca, Zacarias levanta as mãos à altura dos olhos de Maxi:
- Espie. Pensei que eram perebas, parece que é bexiga, da negra.
Instintivamente Maxi recua, também ele sabe algo sobre a bexiga e a reconhece de imediato. São dez horas da noite, a cidade dorme, o doutorzinho deve estar no bem bom com a gostozona trazida de Aracaju, cabocla de fechar o comércio, de uma assim ando precisado Maximiano. Vale a pena acordar o doutor, arriscar um esbregue? Ninguém gosta de ser interrompido em hora de botar, Maxi vacila.
Mas se a bexiga for negra, como parece? Volta a fixar o rosto do alugado, as bolhas são marrons, escuras, típicas da maldita, da peste mortal.
Funcionário há dezoito anos da Directoria de saúde Pública, tendo servido em todo o interior, alguma coisa Maximiano aprendeu.
- Vamos lá compadre, a casa do doutor é aqui pertim fronteira.
Quem responde às palmas é a mulher, chama-se Tereza Batista, o vigia ouvira e guardara o nome.
Sou eu, Maximiano, siá-dona. Diga ao doutor que está aqui um homem atacado de bexiga. De bexiga negra. (clik na imagem e aumente)
Lei é promulgada para ser obedecida – lei, regulamento, horário. O horário do posto de saúde estava afixado no portão, bem à vista: das nove da manhã ao meio-dia, das duas às cinco da tarde. Teoricamente, pois tanto Maximiano como Juraci não apreciam interrupções durante o tempo dedicado ao estudo e à preparação da lista do jogo do bicho pelo primeiro, à redacção de diárias e comoventes cartas para o noivo pela segunda, tempo sagrado.
Quanto ao doutor não cumpre horário rígido, aparecendo quando melhor lhe dá na gana, pela manhã ou à tarde mas sempre com pressa; houvesse assunto de muita urgência e bastaria a enfermeira ou o vigia atravessar a rua – situando-se a residência do médico defronte ao posto – e chamá-lo tirando-o quase sempre da cama onde, se não estava a botar em Tereza, dormia a sono solto, esquecido inclusivamente das ambições políticas, dos projectos de organizar núcleo no município.
Zacarias, farto de bater palmas, de gritar ó de casa! Soqueia a porta com as duas mãos fechadas. Ausente da cidade o farmacêutico Tesoura, de viagem em Aracaju, doutor Evaldo em casa de um doente, sobrava-lhe o posto de saúde, o mediquinho moderno. Zacarias, o peito tomado de medo, ameaça arrombar a porta. Um homem surge na esquina, apressa a marcha, posta-se ante o trabalhador:
- Que é que quer?
- O senhor trabalha aqui?
- Trabalho, sim, e daí?
- Cadê o doutor?
- E o que é que você quer com o doutor?
- Quero que ele me receite.
- A esta hora? Está maluco? Não sabe ler? Olhe o horário aí, das…
- Vosmicê pensa que doença tem hora?
A voz rouca, Zacarias levanta as mãos à altura dos olhos de Maxi:
- Espie. Pensei que eram perebas, parece que é bexiga, da negra.
Instintivamente Maxi recua, também ele sabe algo sobre a bexiga e a reconhece de imediato. São dez horas da noite, a cidade dorme, o doutorzinho deve estar no bem bom com a gostozona trazida de Aracaju, cabocla de fechar o comércio, de uma assim ando precisado Maximiano. Vale a pena acordar o doutor, arriscar um esbregue? Ninguém gosta de ser interrompido em hora de botar, Maxi vacila.
Mas se a bexiga for negra, como parece? Volta a fixar o rosto do alugado, as bolhas são marrons, escuras, típicas da maldita, da peste mortal.
Funcionário há dezoito anos da Directoria de saúde Pública, tendo servido em todo o interior, alguma coisa Maximiano aprendeu.
- Vamos lá compadre, a casa do doutor é aqui pertim fronteira.
Quem responde às palmas é a mulher, chama-se Tereza Batista, o vigia ouvira e guardara o nome.
Sou eu, Maximiano, siá-dona. Diga ao doutor que está aqui um homem atacado de bexiga. De bexiga negra. (clik na imagem e aumente)
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