quarta-feira, julho 27, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA


Episódio Nº 163




Mas naquela noite dos jasmineiros em flor, noite de confidência e intimidade sem limite, na qual o doutor abriu o coração, lavou o peito rompendo a dura crosta de orgulho, quando Tereza foi arrimo para o desamparo, bálsamo para o desencanto, alegria a apagar a tristeza e a solidão, quando a clandestina casa da amásia foi o lar e ela a esposa que lhe faltavam, naquela noite única de paz com a vida, o desvelo envolveu o prazer e o fez extremo.

Durante um tempo vadio trocaram agrados de namoro, brincadeiras de noivos em núpcias, antes de partirem em cavalgada o cavaleiro e a sua montaria, doutor Emiliano Guedes e Tereza Batista. Quando o doutor se alteou para assumi-la, Tereza o enxergou tal como o conhecera na roça do capitão, bem antes de vir com ele viver: montado em árdego ginete, na mão direita o rebenque de prata, a esquerda a afagar o bigode, atravessando-a com olhos de verruma – dá-se conta de tê-lo amado desde então, pois, escrava morta de medo, ousara reparar num homem. Pela primeira vez.

Nua de trapos e lençol mas coberta de beijos, anelante, recebe-o por cima e com os braços e as pernas o prende e tranca contra o ventre; a cavalgada irrompe nos prados infindos do desejo. Incansável galope por montanhas e rios, subindo, descendo, cruzando caminhos, sendas estreitas, vencendo distâncias, crepúsculos e auroras, à sombra e ao sol, ao luar amarelo, no calor e no frio, num beijo de amor eterno, ai, Emiliano, meu amor, juntos atingem na hora exacta o destino do mel. As línguas se enroscam, torna-se mais apertado o abraço quando os corpos se abrem e desfazem em gozo. Ai, Tereza, exclama o amante e tomba morto.

4

Ao saltar da cama, Tereza sente apenas o peso da morte sobre o peito e o ventre, o derradeiro estertor do amante, um gemido cavo, de dor ou de prazer? Ai, Tereza, disse ele e ali mesmo morreu, em pleno amor; já o companheiro inerte e ela ainda em júbilo se deleitando na folgança, a desfazer-se em néctar até sentir o peso da morte. Não pôde gritar ou pedir socorro, tomados o peito, a garganta, a boca suja de sangue do outro boca e na devida descrição.

Foram alguns minutos tão-somente durante os quais Tereza Batista se sentiu maldita e louca, tendo a morte por amante, companheira de cama e de deleite. Olhos esbugalhados, muda e perdida, imóvel ante o leito de alvos lençóis lavados em água de alfazema, não enxerga o doutor a quem o coração falhara, gasto das decepções e no orgulho; vê a morte em gozo exposta.

Ela, Tereza, a tivera peito contra peito, com os braços, pernas e coxas a prendera ao ventre, dela penetrada, a dar-se e a recebê-la.

A festa terminou. De súbito foi a morte, tão-somente a morte, instalada na noite, estendida na cama, arrodilhada no ventre e no destino de Tereza Batista.

5


À custa de ingente esforço, Tereza enfia um vestido, vai acordar Lula e Nina, o casal de empregados. Deve estar com aspecto de louca, a criada se alarma:

- O que foi siá Tereza?

Lula aparece na porta do quarto, acabando de vestir a camisa, Tereza consegue dizer:

- Vá correndo chamar o doutor Amarílio, diga para vir depressa, doutor Emiliano está passando mal.

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