quinta-feira, outubro 13, 2011

TEREZA


BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA



Episódio Nº 229








- Venha, Marina – diz Cristóvão.

Túlio explica ao padre e ao médico:

- Vamos colocá-lo na ambulância como se ele estivesse apenas doente, um enfarte ou um derrame, à sua escolha, doutor Amarílio. Não morreu em cima de ninguém, um homem na posição dele tem de morrer decentemente. No caminho do hospital, vindo da usina.

Ouve-se ao longe o silvo estridente da assistência, despertando o povo e a curiosidade de Estância. Não demora a parar à porta do chalé. Os enfermeiros descem, tomam da maca.

- O melhor, doutor Amarílio, é o senhor vir com ele na ambulância, até Aracaju. Para manter as aparências.

Nunca termina nunca esse pesadelo! Mas o doutor pensa na conta a apresentar e concorda. Na passagem, saltará em casa um instante para acalmar a impaciente Veva. De volta, terá muito o que contar.

Túlio, padre Vinícius e Nina dirigem-se ao quarto, enquanto o médico e Lula vão ao encontro dos enfermeiros. A sirene da ambulância acordou as crianças, os vizinhos e o doutor Olavo Bittencourt, que sai às pressas para amparar a abandonada Apa. Como diabo pegara no sono? Viera fumar um cigarro, adormecera na rede, merecerá perdão? Na corrida cruza com Tereza na sala de jantar.

Tereza entra no quarto, nem parece ver os parentes e aderentes. Anda para junto da cama, fica um instante em silêncio a fitar o rosto bem amado.

- Tirem essa maldita daqui… - grita Marina.

- Finiscela, porca Madona! Cala a boca! Explode Túlio.

Como se nada ouvisse e estivesse sozinha, Tereza curva-se sobre o corpo do doutor, toca-lhe o rosto, o bigode, os lábios, o cabelo. É hora de partir, Emiliano Eles só levarão teu cadáver, tu irás comigo. Beija-lhe os olhos, sorri para ele. Toma aos ombros o amásio, o amante, o amigo, seu amor, dai do quarto.

Na maca, os enfermeiros, carregam o corpo de um usineiro, director de Banco, empresário, senhor de léguas de terra, eminente cidadão, para morrer com decência na ambulância a caminho do hospital, de enfarte ou de derrame, como o senhor prefira doutor Amarílio.

37

- Sangue ruim, Tereza. Sangue podre, o meu, o de minha gente.

Foram duas horas, pouco mais, pareceram uma eternidade desolada. Emiliano contou e comentou, áspero e cru, sem escolher palavras.

Nunca Tereza imaginara escutar da boca do doutor o relato de tais factos, ouvir tais expressões a respeito dos irmãos, do filho, da filha. Em casa da amásia, ele não falava e se alguma referência a respeito lhe escapou no decorrer desses seis longos anos foi de elogio. Uma vez lhe mostrara um retrato de Apa, mocinha, os olhos azuis do pai, a boca sensual, linda. É perfeita, Tereza, dissera ele enternecido, é meu tesouro.
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