quinta-feira, dezembro 08, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA


Episódio nº 277

Madruga conta que na véspera dirigira-se à zona na intenção de aliviar a natureza, fracassara no intento. Castelos e pensões vazios, quartos desertos, portas fechadas. Atribuiu a falta de mulheres ao tardio da hora, já passava das duas da manhã.

Saiu mariscando, quem sabe encontraria alguma escuteira pelos bares. Entrou no Bar Flor de São Miguel, a sala estava cheia e barulhenta, nas mesas numerosas profissionais. Mas nenhuma o aceitou. Informaram-lhe achar-se o puteiro de balaio fechado até às raparigas da Barroquinha regressarem a suas casas.

Peixe Cação não dá maior importância ao facto: basta a polícia prender e exemplar arruaceiras, como fez ontem na Barroquinha, para outras vagabundas se juntarem nos botequins a beber e a xingar. Fica, no entanto, de orelha em pé quando Heron Madruga se refere a uma das braças, a mais exaltada de todas, sujeita bonita, benza Deus, a quem conhecera em Recife, alguns anos faz, uma mulher metida a bater em homem e, a verdade manda que se diga, por lá batera em mais de um.

O próprio Madruga tivera ocasião de comprovar-lhe a valentia, testemunha de vista e não prenhe pelos ouvidos. De nome Tereza Batista, tratada por Tereza Pé nos Culhas, o porquê do apelido está na cara.

Ao ouvir o nome detestado, Peixe Cação rosna e baba.

- Ontem, essa maldita escapou da minha mão, até agora não sei como, até parece coisa de feitiçaria. Mas, não tarda, ela me paga, ora se paga! Foi bom eu saber que ela anda açulando as putas contra a gente, puta mais sem jeito!

37

Naquele 21 de Setembro, a manchete do vespertino anunciou a todos os baianos: CIDADE EM FESTA – A PRIMAVERA E OS MARINHEIROS.

No Bar Flor de São Miguel, na véspera à noite, antes da notícia da invasão da Barroquinha pelas tropas da Delegacia de Jogos e Costumes e do grito de guerra de Nília Cabaré, antes do pronunciamento de Exu Tiriri, O moço Kalil Chamas verberara, com palavras de candente indignação, a caterva de subservientes imitadores dos costumes europeus a festejarem a chegada da primavera em meio aos aguaceiros de Setembro – a mesma manada de idiotas a fantasiar de coelho os filhos por ocasião da Páscoa, a colocar em tórrido Dezembro algodão em árvores de Natal, simulando neves de Inverno.

- Só faltam vestirem casacões de pele e tremerem de frio! Vocês vão ver, amanhã os colégios desfilando para dizerem que a Primavera chegou. Puro colonialismo. Tomara que chova sem parar.

Estudante de Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia, caixeiro na loja de antiguidades do pai, na Rua Ruy Barbosa, desenhista amador a sonhar com exposições, sucesso e fama, nacionalista ferrenho, Kalil Chamas é, ao demais, o feliz xodó da doce Anália.

Na mesa do bar exalta-se contra a importação idiota de hábitos estrangeiros sem sentido no Brasil. No trópico o inverno dura seis meses de chuva, o verão seis meses de escaldante calor, falar em Primavera e Outono é ridículo, Ridículo! – põe-se de pé, o dedo longo em riste a completar a exclamação.

Aqui reina a eterna primavera… - declama Tom Lívio, actor de teatro em busca de palco onde demonstrar talento, aproveitando lugar e ocasião para modular a voz.

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