quinta-feira, março 29, 2012

GABRIELA
CRAVO
E

CANELA


Episódio nº 60


Então Clemente a viu órfã e só, necessitada e triste. Pela primeira vez pensou compreendê-la. Nada mais era do que uma pobre moça, quase menina ainda, a quem proteger.

Aproximou-se e longamente falou dos seus planos. Muito lhe tinham contado daquela terra do cacau para onde iam. Sabia de gente que saíra do Ceará sem tostão e voltara poucos anos depois a passeio, arrotando dinheiro. Era o que ele ia fazer.

Queria derrubar mata, ainda existia alguma, ter terra sua, ganhar bastante. Gabriela iria com ele e, quando aparecesse um padre por aquelas bandas, casariam. Ela fez que não com a cabeça, agora não ria seu riso de mofa; disse apenas.

- Vou pró mato não, Clemente.

Outros morreram e os corpos ficaram pelo caminho, pasto dos urubus. A caatinga acabou, começaram as terras férteis, as chuvas caíram.

Ela continuava a deitar-se com ele, a gemer e a rir, a dormir recostada sobre seu peito nu. Clemente falava cada vez mais sombrio, explicava as vantagens, ela apenas ria e balançava a cabeça numa renovada negativa.

Certa noite ele teve um gesto brusco, atirou-a para um lado num repelão:

- Tu não gostas de mim!

De súbito, saído não se sabe de onde, o negro Fagundes apareceu, a arma na mão, um brilho nos olhos.

- Gabriela disse:

- Foi nada não, Fagundes.

Ela havia batido contra o tronco da árvore junto ao qual estavam deitados. Fagundes baixou a cabeça, foi embora.

Gabriela ria, a raiva foi crescendo dentro de Clemente. Aproximou-se dela, tomou-lhe dos pulsos, ela estava caída sobre o mato, o rosto ferido:

- Tenho até vontade de te matar e a mim também…

- Porquê?

- Tu não gostas de mim…

- Tu é tolo…

- Que é que vou fazer, meus Deus?

- Importa não… - disse ela e o puxou para si.

Agora, naquele último dia de viagem, desnorteado e perdido, ele terminara por se decidir. Ficaria em Ilhéus, abandonaria seus planos, a única coisa importante era estar ao pé de Gabriela.

- Já que tu não quer ir vou arranjar jeito de ficar em Ilhéus. Só que não tenho ofício; além de lavrar terra não sei fazer um nada…

Ela tomou-lhe a mão num gesto inesperado, ele sentiu-se vitorioso e feliz.

- Não, Clemente, fique não. Pra quê?

- Pra quê?

- Só pra te ver, pra gente estar junto.

- E se a gente não puder se ver? É melhor não, tu vai pra teu lado, eu vou pró meu. Um dia, pode ser, a gente se encontra outra vez. Tu feito homem rico, nem vai me reconhecer
.
(Click na imagem e aumente)

Site Meter