quarta-feira, maio 23, 2012


A Crise é Má Conselheira



Nada fará mudar a natureza humana quando se trata de sobreviver.

São comportamentos ou reacções, talvez mais estas, instintivas que obedecem a leis que se inscrevem em padrões de sobrevivência muito anteriores à própria civilização.

Quando se trata de sobreviver parece que o mundo é demasiado pequeno… os horizontes estreitam-se.

De certa forma, parece que foi isso que os trabalhadores ingleses apoiados pelos respectivos sindicatos nos quiseram dizer aqui há uns tempos, quando se manifestaram e fizeram greves de protestos contra a contratação de portugueses e italianos para uma empreitada de uma empresa francesa a operar no Reino Unido:

-… “Desculpem lá, isto não tem nada de pessoal, mas estamos na nossa terra e temos que defender os nossos empregos…” dizia o trabalhador inglês ao ser entrevistado para a televisão, a modos de quem pede desculpa.

Os trabalhadores portugueses regressaram a Portugal e ao falarem para a TV mostraram-se perfeitamente conformados, pensando lá para com eles:

 - “…na nossa terra teríamos feito o mesmo.”

No fundo, é um procedimento de género idêntico ao que resulta das palavras do Presidente Obama quando pede ou estimula os seus concidadãos a comprarem americano e muitos outros países europeus a lançaram campanhas à aquisição de bens e serviços nacionais.

É verdade que a Comissão Europeia já assinalou que irá analisar a conformidade das novas regras americanas com os compromissos assumidos no âmbito da Organização Mundial do Comércio.

E também é verdade que no plano interno europeu irá ser prestada atenção às medidas que os Estados venham a tomar em violação do princípio da não descriminação.

É natural, portanto, que todas estas reacções proteccionistas com repercussões no mercado de trabalho venham a ocupar nos próximos tempos, a agenda dos que têm que tomar decisões políticas.

O Dr. António Vitorino, face a estes comportamentos, afirma, com toda a razão que lhe assiste, que não só estamos a tornar mais difícil a saída da crise como, igualmente, estamos a atentar contra valores civilizacionais.

Na verdade, uma medida proteccionista favorece no curto prazo mas prejudica no médio e longo prazo. A crise é global e tudo quanto possa contribuir para diminuir os fluxos comerciais internacionais de produtos e serviços, prolongará e agravará a crise.

No plano civilizacional é, realmente, um retrocesso, um voltar atrás, ao tempo do cada um por si mas, como resistir nestes tempos de sobrevivência a estas atitudes?

Lembramo-nos todos quando, ainda não há muitos meses, duas cidades no norte de Portugal disputaram duramente entre si, a instalação de uma fábrica que iria criar postos de trabalho em qualquer um dos concelhos em que viesse a instalar-se.

Estávamos no mesmo país, até na mesma região, mas nenhum cidadão de qualquer um dos dois Concelhos teria levado a bem que o seu Presidente não tivesse feito tudo para “ganhar a fábrica para si”,

É inevitável… a expressão do trabalhador inglês ao justificar a sua luta pelos postos de trabalho que iriam ser criados, ali, na sua terra, não demonstrava nenhuma animosidade contra os candidatos portugueses ou italianos, apenas uma reivindicação que a ele lhe parecia completamente justa.

O Dr. António Vitorino reconhece a delicadeza do momento e escreve:

 - “A situação em causa espelha a angústia e insegurança dos trabalhadores britânicos perante o espectro do desemprego e revela que há dinâmicas que, uma vez desencadeadas não são facilmente reversíveis, além de abrirem as portas para práticas retaliatórias que, no limite, ainda agravarão mais a situação de crise em que vivemos”.

Por extensão, podemos dizer que uma crise financeira origina outras crises de natureza moral que tem a ver com princípios e até com a própria racionalidade.

Graves responsabilidades para as Organizações Internacionais uma vez que as nacionais não têm força ou coragem para as verdadeiras soluções que nunca serão fáceis.

 A Crise é Má Conselheira. 


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