GABRIELA
CRAVO
E
Episódio Nº 88
- Só que aquele
tempo quando cujo chegava com as mãos abanando, com a cara e a coragem, e ia
para a mata plantar roça, se acabou. Naquele tempo era bom… Bastava ter peito,
tocar para a frente, liqui dar quatro
ou cinco que tinham a mesma tenção, e o cidadão tava rico…
- Ouvi falar
desse tempo… - disse o negro Fagundes. – Foi por isso que vim…
- Não gosta da
enxada, moreno? – perguntou Melk.
- Não desprezo,
não sinhô. Mas manejo melhor o pau de fogo… – riu acariciando a repetição.
- Ainda há
matas grandes. Lá para a serra do Baforé, por exemplo. Terra
boa para o cacau como não há outra…
- Só que é
preciso comprar cada palmo de mata. Tudo está medido e registado. O senhor
mesmo tem terras por lá.
Um pedacinho… –
confessou Melk. – Coisa à toa. Vou começar a derrubar a mata no ano que
vem, se Deus qui ser.
- Hoje Ihéus
não vale mais nada, não é como dantes. Tá virando lugar importante –
lastimou-se um remeiro.
- E por isso
não presta?
- Dantes um
homem valia pela coragem. Hoje, só quem enriquece é turco Mascate e espanhol de
armazém. Não é como antigamente…
- Aquele tempo
acabou – explicou Melk – Agora chegou o progresso, as coisas são diferentes.
Mas um homem trabalhador ainda se arranja, ainda há lugar para todo o mundo.
- Não se pode
mais nem dar uns tiros na rua… querem logo prender a gente.
A canoa subia
vagarosa, as sombras da noite a envolviam, gritos de animais chegavam da selva,
papagaios faziam súbita algazarra nas árvores. Só Clemente ia silencioso, todos
os demais participavam da conversa, contavam casos, discutiam sobre Ilhéus.
- Essa terra
vai crescer demais é no dia que começar a exportação directa.
- É mesmo.
Os sertanejos não entendiam, Melk Tavares explicou:
todo o cacau para o estrangeiro, para a Inglaterra, para a Alemanha, a França,
os Estados Unidos, a Escandinávia, a Argentina, saía pelo porto de Baía. Um
dinheirão de impostos, a renda exportação, tudo ficava na capital, Ilhéus não
via nem sobras.
A barra era estreita, pouco profunda. Só com muito
trabalho – havia até quem dissesse não haver jeito – seria possível capacitá-la
para a passagem dos grandes navios. E quando os grandes cargueiros viessem
buscar o cacau no porto de Ihéus, então poder-se-ia falar realmente em progresso…
- Agora só se
fala num tal de seu Mundinho Falcão, coronel. Diz que ele vai resolver… Que é
um homem danado.
- Tá pensando
na moça? – perguntou Fagundes a Clemente.
- Nem me disse
até logo… Nem me olhou de despedida.
- Ela tava
virando tua cabeça. Tu não era mais o mesmo.
- Como se a
gente nem se conhecesse… Nem até logo.
- Mulher é
assim mesmo. Num vale a pena.
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