PRECISAREMOS DE DEUS PARA SERMOS BONS OU
MAUS?
Será que existe uma consciência moral
embutida nos nossos cérebros tal como temos o instinto sexual ou o medo das
alturas?
Sobre esta questão o biólogo Marc Hauser,
biólogo da Universidade de Harvard, realizou estudos estatísticos e
experiências do domínio psicológico recorrendo a questionários colocados na
Internet para investigar a consciência moral de pessoas reais.
A forma como as pessoas reagiram a estes
testes de moral e a sua incapacidade para expressarem as razões que as levaram
a reagir dessa forma parecem ser, em grande medida, independentes das crenças
religiosas ou da falta delas.
Mas vejamos, textualmente, o que nos diz
o autor destes estudos, Marc Hauser:
“Por
detrás dos nossos juízos morais há uma gramática moral universal, uma faculdade
da mente que foi evoluindo ao longo de
milhões de anos de
maneira a incluir um conjunto de princípios que construísse um leque de
sistemas.”
Eis o dilema que foi colocado:
- Uma pessoa tem ao seu alcance o
comando das agulhas que pode desviar o carro eléctrico para uma via de
resguardo de forma a salvar 5 pessoas que estão presas na via principal, um
pouco mais à frente.
Infelizmente há um homem preso na via de
resguardo mas, como é só um a maior parte das pessoas concorda que é moralmente
admissível senão mesmo obrigatório a mudança de agulha matando uma mas salvando
cinco.
Mas, numa outra variante da situação, o
carro eléctrico só pode ser parado pondo-lhe no caminho um peso grande largado
de uma ponte situada por cima da via. É obvio que temos de largar o peso mas,
se o único peso disponível for um homem muito gordo sentado na ponte a admirar
o pôr-do-sol?
Quase toda a gente concorda que, neste
caso, é imoral empurrar o homem gordo da ponte, embora de um certo ponto de
vista, o dilema possa parecer semelhante ao anterior no qual se mata uma pessoa
para salvar cinco.
A maior parte das pessoas tem uma forte
intuição que existe uma diferença crucial nos dois casos, embora não consiga
exprimi-la.
Vejamos um caso idêntico:
- Num hospital há cinco doentes a
morrerem cada um por falha de um órgão diferente e todos eles seriam salvos se
fosse encontrado dador disponível para cada um deles.
O cirurgião repara que na sala de espera
está um homem saudável cujos cinco órgãos em questão se encontram em boas
condições de funcionamento e são adequados para transplante.
Neste caso não há quase ninguém capaz de
dizer que a acção moralmente indicada seria matar esse homem para salvar os
outros cinco.
Tal como no caso do homem gordo sentado
na ponte a ver o pôr-do-sol, a intuição que a maior parte de nós partilha é que
um espectador inocente não deve ser arrastado para uma situação problemática e
usado para salvar outras pessoas sem o seu consentimento.
Immanuel Kant, filósofo alemão,
expressou de forma admirável o princípio segundo o qual um ser racional que não
haja dado o respectivo consentimento nunca deverá ser usado como simples meio
para atingir um fim, mesmo que esse fim seja o benefício de outras pessoas.
A pessoa que se encontrava presa na via
de resguardo do carro eléctrico não estava a ser usada para salvar a vida das cinco pessoas presas na linha
principal, é a via de resguardo que, propriamente, está em causa, sucedendo
apenas que o homem tem o azar de se encontrar nessa via.
Enquanto isto, o homem gordo sentado na
ponte e o homem saudável na sala de espera do hospital estavam nitidamente a
serem utilizados e isso é que viola o princípio de Kant, para quem, não fazer
esta distinção seria um absurdo moral. Para Hauser essa distinção foi-nos
embutida ao longo da nossa evolução.
Numa sugestiva aventura no domínio da
Antropologia o Dr. Hauser e colegas seus adaptaram as suas experiências morais
aos Kunas, uma tribo da América Central que tem poucos contactos com os
ocidentais e não possuem uma religião formal.
Os investigadores fizeram as respectivas
adaptações à realidade local com crocodilos a nadarem na direcção de canoas e
os Kunas, mostraram ter, com pequenas diferenças, juízos morais semelhantes aos
nossos.
Hauser também se interrogou sobre se as
pessoas religiosas diferem dos ateus quanto às suas intuições morais.
Seria evidente que, se fosse certo que é
à religião que vamos buscar a nossa moralidade, elas deviam ser diferentes mas
parece que o não são.
Trabalhando em conjunto com o filósofo
de moral Peter Singer, Hauser centrou-se em três modelos hipotéticos comparando
depois as respostas dos ateus e das pessoas religiosas:
1º No dilema do carro eléctrico 90 % das
pessoas disseram que era admissível desvia-lo, matando uma pessoa para salvar
cinco.
2º Vê uma criança a afogar-se num
pequeno lago e não há mais ninguém por perto para ajudar. Você pode salvar mas,
se o fizer, estraga as calças: 97 % das pessoas concordaram que se deve salvar
a criança (surpreendentemente, parece que 3% preferiam salvar as calças).
3º No dilema do transplante de órgãos já
descrito: 97% dos sujeitos concordaram que é moralmente condenável pegar na
pessoa saudável da sala de espera e matá-la para lhe retirar os órgãos,
salvando com isso cinco outras pessoas.
A principal conclusão deste estudo é que
não existe diferença estatisticamente significativa entre ateus e crentes
religiosos quanto à formação destes juízos o que é compatível com o ponto de
vista segundo o qual não precisamos de Deus para sermos bons – ou maus.
No entanto, Steven Weinberg, físico
norte-americano galardoado com o Prémio Nobel é mais pessimista:
-
“A religião é um insulto à dignidade humana. Com ou sem ela, haveria sempre
gente boa a fazer o bem e gente má a fazer o mal. Mas é preciso a religião para
pôr gente boa a fazer o mal.”
Blaise Pascal (1623-1662), filósofo,
físico e matemático francês disse algo semelhante:
-
“Os homens nunca fazem o mal tão completa e alegremente como quando o fazem por
convicção religiosa.”
Lembrem-se apenas das guerras-santas... umas inspiradas e em nome de Jesus, um pacifista, e outras por Maomé, um chefe guerreiro. O resultado foi o mesmo em termos de crueldade... era preciso impor um Deus nem que fosse a ferro e fogo!
<< Home