quinta-feira, julho 12, 2012


GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 147


À noite, na fazenda (após Mundinho ter visto os trabalhadores na colheita, nos cochos de cacau mole, nas barcaças, numa dança de passos miúdos revolvendo o cacau ao sol), conversavam à luz das lâmpadas de querosene.

Altino contava casos de jagunços, falava dos tempos antigos, quando haviam conquistado a terra. Alguns trabalhadores, sentados no chão, participavam na conversa, relembravam detalhes. Altino apontava um negro:

 - Esse está comigo há uns vinte e cinco anos. Apareceu por aqui fugido, era cabra dos Badarós. Se tivesse que cumprir penas pelos homens que despachou, a vida inteira não chegava.

O negro sorria, mostrando os dentes alvos, mascava um pedaço de fumo, as mãos calosas, os pés cobertos com a crosta formada pelo mel seco do cacau.

 - O que é que o moço vai pensar de eu, seu coronel?

Mundinho queria conversar política, ganhar o rico fazendeiro para a sua causa. Mas Altino evitava o assunto, apenas se referia – e isso durante o almoço em Rio do Braço – à fogueira erguida com a edição do Diário de Ilhéus. Para reprová-la.:

 - Muito mal feito… isso foi coisa de outro tempo que já passou, graças a Deus. Amâncio é homem de bem, mas violento como o Diabo, nem sei como ainda está vivo. Foi ferido três vezes nos barulhos, ficou com um olho vazado, um braço esquecido. E não se emenda, Melk Tavares também não foi de brincadeira, sem falar em Jesuíno, coitado… Ninguém está livre de ter de cometer uma desgraça, Jesuíno não tinha outro jeito. Mas porque ainda se vem a queimar jornal? Muito mal feito…

Catava espinhas no peixe:

 - Mas vosmicê me desculpe se lhe digo, também não agiu direito. Esse é meu pensar.

 - Porquê? Porque o jornal estava violento? Campanha política não se faz com elogios aos adversários.

 - Que o seu jornal está danado, isso está. Cada artigo que dá gosto ler… Ouvi dizer que é o doutor que escreve; aquele tem mais tutano na cabeça que Ilhéus inteiro. Hominho inteligente… Gosto de ouvir ele falar, parece um sabiá. Nisso vosmicê tem razão. Jornal é para meter o pau rachar o inimigo. Tá no certo, eu até tomei uma assinatura. Não falo disso, não.

 - De quê, então?

 - Seu Mundinho, foi mal feito queimar o jornal. Não aprovo, não. Mas já que eles queimaram, então o senhor estava na casa do sem jeito. Como Jesuíno. Ele queria matar a mulher? Não queria. Mas ela lhe meteu os chifres, ele teve que matar, senão ficava mais desmoralizado que capão de terreiro, boi de carro. Porque vosmicê não queimou o jornal deles, não os números, mas a casa, não rebentou as máquinas?

Me desculpe, era o que vosmicê tinha que fazer, senão ficam dizendo que vosmicê é muito bom e tal mas para governar Ilhéus e Itabuna é preciso ser macho, não baixar a cabeça.

Coronel, não sou covarde, pode crer. Mas como o senhor mesmo disse esses métodos correspondem a um tempo passado. É exactamente para mudá-los, terminar com eles, para fazer de Ilhéus terra civilizada, que me meti em política.

Além do mais onde ia arranjar os jagunços , não os possuo…
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