CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 149
Enxergou também, na janela, a loira
Jerusa, tirou-lhe o chapéu, ela acenou adeus com a mão O que revelava pelo
menos senso de humor, já que nas vésperas Ribeirinho expulsara de Guaraci, um
povoado próximo da sua fazenda a um preposto dos Bastos, funcionário da
Intendência.
O homem chegara a Ilhéus em petição de
miséria, quebrado de pau, vestido com umas roupas emprestadas, enormes para o
seu corpo, pois fora nu em pêlo que tivera de ganhar a estrada, a pé na noite
da surra…
Do Pássaro Sofrê
Já não podia mais Nacib, perdidos o
sossego a alegria, o gosto de viver. Deixara até de enrolar a ponta dos
bigodes, murchos agora sobre a boca de riso perdido. Era um pensar sem fim,
nada igual para consumir um homem, tirar-lhe o sono e o apetite, emagrecê-lo,
deixá-lo sem graça, melancólico.
Tonico Bastos debruçava-se no balcão,
servia-se do amargo, olhava irónico a figura abatida do dono do bar:
-
Você está decaindo, árabe. Nem parece o mesmo, grandes olhos arregalados,
pousavam-se no elegante tabelião. Tonico crescera em sua estima nesses tempos.
-
Sempre tinham sido amigos, porém de relações superficiais, conversas sobre
mulheres da vida, idas ao cabaré, tragos tomados juntos. Ultimamente, no
entanto, desde a aparição de Gabriela, estabelecera-se entre eles uma
intimidade mais profunda. De todos os frequentadores diários do aperitivo, era
Tonico o único a manter-se discreto na hora do meio-dia, quando ela chegava de
flor atrás da orelha.
Apenas a cumprimentava delicadamente,
perguntava-lhe pela saúde, elogiava-lhe o tempero sem igual. Nem requebro de
olhos, nem palavrinhas sussurradas, nem tentava tomar-lhe da mão.
Tratava-a como se ela fosse respeitável
senhora, bela e desejável, porém inacessível. De nenhum outro temera tanto
Nacib a concorrência, ao contratar Gabriela, quanto de Tonico. Não era ele o
conqui stador sem rival, o tombador
de corações?
O mundo é assim, surpreendente e
difícil: mantinha Tonico a máxima descrição e respeito na presença da excitante
Gabriela. Todos sabiam das relações do árabe com a formosa empregada. É verdade
que, oficialmente, ela não passava de sua cozinheira, nenhum outro compromisso
entre eles.
Pretexto para cobrirem-na, mesmo na sua
vista, de palavras doces, envolverem-na em frases melosas, meter-lhe
bilhetinhos na mão. Os primeiros ele os lera displicente, fizera bolinhas de
papel e os atirara ao lixo. Agora despedaçava-os, raivoso; eram tantos, alguns
até indecentes. Tonico, não. Dava-lhe prova de verdadeira amizade, a respeitá-la
como se ela fosse senhora casada, esposa de coronel.
Era ou não era amizade, sinal de
consideração? Nacib não o ameaçava, como fizera Coriolano a propósito de Glória.
No entanto, só de Tonico, não tinha queixas e somente para ele abria seu
coração doloroso como túmida espinha.
(Click na imagem da Gabriela completamente alheia ao terrível drama que Nacib está vivendo por sua causa...)
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