As Raízes da Religião
Toda a gente tem a sua teoria de
estimação sobre a origem da religião, a razão pela qual todas as culturas
humanas têm uma. Uns, dizem que reconforta e consola, outros, que promove a
união dos grupos, satisfaz a nossa ânsia de percebermos porque existimos, etc…
Sabemos hoje que somos o produto de um
processo de evolução darwiniana, tal como todos os seres vivos. Os belíssimos
documentários que são trazidos até nós pelos programas dos canais da Odisseia e
da National Geografic sobre a origem do Homem, não nos deixam dúvidas sobre a
dificuldade desse processo. Várias “tentativas” que não sabiam que eram
“tentativas” e todas abortaram ao longo de alguns milhões de anos.
Finalmente, ficámos nós, só nós, todos
os outros desapareceram, não vingaram, como se costuma dizer. Conhece-se alguma
coisa desse processo - que continua e continuará - o suficiente para podemos
dizer que ele foi muito difícil. Uma vez, pelo menos, a quando da explosão do vulcão Toba, há 75.000, na Indonésia, estivemos à beira do "abismo" reduzidos ao número mínimo de elementos capaz de sobreviver.
Por isso, é legítimo perguntar que pressão ou
pressões foram exercidas pela selecção natural que tenham favorecido, na sua
origem, o impulso para a religião, tanto mais quanto é verdade que a religião é
esbanjadora e extravagante. Os rituais religiosos têm custos em tempo,
recursos, dor e privação.
A
religião pode por em perigo a vida do indivíduo mais devoto tal como a dos
outros. Milhares de pessoas foram torturadas por lealdade a uma religião,
perseguidas por fundamentalistas apenas, muitas vezes, por pertencerem a uma fé
alternativa que pouco tinha de diferente. Veja-se o caso dos sunitas e xiitas e entre católicos e protestantes.
Por outro lado, a religião devora
recursos, por vezes numa escala maciça. Uma Catedral medieval podia levar
séculos de trabalho humano a ser construída e, no entanto, nunca era usada como
residência ou com algum outro fim que fosse útil.
A música sacra e a pintura devota
monopolizaram em grande parte o talento da época medieval e do Renascimento.
Gente devota morreu pelos seus deuses e por eles matou. Outros autoflagelaram-se
até as costas verterem sangue, juraram uma vida de celibato ou de silêncio em
clausura, tudo ao serviço da religião.
Para quê tudo isto? Qual o benefício da
religião?
A nossa espécie por muito inteligente
que possa ser, é, no entanto, dotada de uma inteligência «perversa» porque
assimila conhecimentos sobre o mundo natural e de como sobreviver nele mas
depois, em simultâneo, atulham as suas mentes com crenças manifestamente
falsas.
Embora os pormenores variem de região
para região, não se conhece nenhuma cultura no mundo que não tenha a sua versão
da religião, com os seus rituais pródigos em esbanjar tempo, em consumir
riquezas e em gerar hostilidades.
Há pessoas instruídas que abandonaram a
religião, mas todas foram criadas numa cultura religiosa, que normalmente
deixaram para trás através de uma decisão consciente. Lembremos a velha piada
irlandesa que pergunta: «sim, és ateu, mas ateu protestante ou ateu católico?»
Do ponto de vista darwiniano não há
nenhuma dificuldade em explicar o comportamento sexual. Trata-se de fazer
filhos mesmo nas situações em que a contracepção ou a homossexualidade o
parecem contrariar.
Mas, e o comportamento religioso? Porque
jejuam os humanos, porque se ajoelham, autoflagelam, acenam freneticamente com
a cabeça em frente de um muro, porque fazem cruzadas?
(Richard Dawkins. Continuaremos)
<< Home