sexta-feira, agosto 17, 2012


GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 169


Assim o fizera e combinara com Mundinho solicitar do Ministério a direcção do serviço de rectificação e dragagem da barra. O exportador lhe prometera quantia ainda maior para quando o primeiro navio estrangeiro entrasse no porto. E se empenhar por uma promoção.

Que mais podia desejar? No entanto fora meter-se com moça solteira, a bolinar nos cinemas, a fazer-lhe promessas impossíveis. Resultado tivera de telefonar pedindo substituto, fora desagradável a conversa com Mundinho.

Garantira que ao chegar ao Rio, não deixaria o Ministro em paz enquanto as dragas e os rebocadores não fossem enviados. Era tudo quanto podia fazer. O que não podia era ficar em Ilhéus para apanhar de chicote na rua ou levar um tiro na calada da noite.

Trancou-se depois no quarto, dali só sairia para o navio. E a louca a marcar encontro nos rochedos, ele nem acreditava que Melk houvesse em seguida voltado para a roça, onde a colheita findava. Uma louca, ele tinha a mania das doidas, se metia com elas…

Malvina esperava no alto dos penedos. Em baixo, as ondas chamavam. Ele não viria, de tarde quase morrera de medo, ela agora compreendia. Ficou a espuma a voar, as águas chamavam, por um instante pensou em se atirar. Acabaria com tudo. Mas ela queria viver, queria ir-se de Ilhéus, trabalhar, ser alguém, um mundo a conquistar.

Que adiantava morrer? Nas ondas atirou os planos feitos, a sedução de Rómulo, suas palavras e o bilhete que ele lhe escrevera dias depois de desembarcar. Dava-se conta, Malvina, do erro cometido: para sair dali só vira um caminho, apoiada no braço de um homem, marido ou amante.

Porquê? Não era ainda Ilhéus agindo sobre ela, levando-a a não confiar em si própria? Porque partir pela mão de alguém, presa a um compromisso, a dívida tão grande?

Porque não partir com seus pés, sòzinha, um mundo a conquistar? Assim sairia. Não pela porta da morte, queria viver e ardentemente, livre como o mar sem limites.

Segurou os sapatos, desceu dos rochedos, começou a esboçar um plano. Sentia-se leve. Melhor do que tudo fora ele não ter vindo; como poderia viver com um homem covarde?

De amor eterno, ou de Josué transpondo Muralhas.


Naquela série de sonetos, dedicados “ à indiferente, à ingrata, à soberba, à orgulhosa M…” impressos em grifo no alto da lida coluna de aniversários, baptizados, falecimentos e matrimónios do Diário de Ilhéus, Josué afirmara em esforçadas rimas, repetidamente, a eternidade do seu amor desprezado.

Múltiplas qualidades, cada qual mais magnífica, caracterizavam a paixão do professor, mas, de todas elas, era o seu carácter eterno a mais trombeteada, em corpo 10 nas páginas do jornal. Suada eternidade, o professor a contar alexandrinos e decassílabos, a procurar rimas.

Crescera ainda o amor, passara a eterno e imortal, em apaixonada redundância, quando, finalmente, na excitação do assassinato de Sinhàzina e Osmundo, quebrara-se o orgulho de Malvina e o namora começara.
(Click na imagem. O desespero inicial de "Malvina" que rapidamente encontra em sim as forças necessárias para seguir na direcção certa)

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