quarta-feira, agosto 22, 2012


GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 173


Na Papelaria, à tarde, morto de sono, Josué anunciara definitiva volta à poesia, agora sensual, a cantar os prazeres da carne. E acrescentara:

 - O amor eterno não existe. Mesmo a mais forte paixão tem o seu tempo de vida. Chega seu dia, se acaba, nasce outro amor.

 - Por isso mesmo o amor é eterno – concluiu João Fulgêncio – Porque se renova. Terminam as paixões, o amor permanece.

Na sua janela, triunfante e dengosa, Glória sorria para as solteironas, condescendente. Já não invejava ninguém, a solidão acabara.


Canção de Gabriela


Assim, vestida de fustão, enfiada em sapatos, com meias e tudo, até parecia filha de rico, de família abastada. Dª Arminda aplaudia:

 - Não tem em Ilhéus quem chegue a teus pés. Nem casada, nem moça, nem rapariga. Não vejo nenhuma.

Gabriela rodopiava em frente do espelho admirando-se. Era bom ser bonita: os homens enlouqueciam, murmuravam-lhe frases com voz machucada. Gostava de ouvir, se era um moço a dizer.

 - Seu Josué queria que eu fosse morar com ele, a senhora imagine! É um moço tão lindo…

 - Não tem onde cair morto, professor de menino. Nem pense nisso, você pode escolher.

 - Penso não. Morar com ele quero não. Ainda se fosse…

 - Tá assim de coronel querendo, sem contar o Juiz. Sem falar em seu Nacib, esse anda morrendo

- Porque, não sei não… - Sorriu – Tão bom, seu Nacib. Agora não pára de me dar presente. Presente de mais… não é velho nem nada… Tanta coisa para quê? De bom que ele é…

 - Não se espante quando ele lhe pedir em casamento…

 - Não tem precisão porque há-de pedir? Precisa não.

Nacib descobrira-lhe um dente furado, mandara-o tratar, botar dente de ouro. Escolhera ele mesmo o dentista (lembrava-se de Osmundo e Sinhàzinha), um velho magrela na rua do porto. Duas vezes por semana, após enviar os tabuleiros, preparado o jantar de Nacib, ia ao dentista vestida de fustão.

Já estava no fim, o dente curado, era uma pena. Atravessava a cidade, o corpo a gingar, olhava as vitrinas, as ruas entupidas de gente, roçando ao passar.

Ouvia palavras, ditos galantes, via seu Epaminondas, medindo fazenda, vendendo pano. De volta parava no bar, cheio àquela hora do aperitivo. Nacib zangava-se:

 - Que veio fazer?

 - Passei só para ver…
(Click na imagem. Estamos na vindima, porque não uma uvinhas?)

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