sábado, outubro 20, 2012


ENTREVISTA FICCIONADA
 COM JESUS Nº 81 SOBRE O TEMA:
 “A CÉSAR O QUE É DE CÉSAR”


RAQUEL -  Palestina, há 2000 anos. Um país ocupado. Violência diária: o terror das tropas romanas e a resistência armada da população. Uma situação similar à vivida hoje nos vários pontos do planeta. Connosco, mais uma vez, Jesus Cristo.

JESUS -  Obrigado, Raquel, por me dares a oportunidade de falar, mais uma vez, com tanta gente que eu não vejo, mas que está nos ouvindo.

RAQUEL -  Nos contava que em seu tempo havia guerrilha rural na Galileia e guerrilha urbana em Jerusalém. E que em seu grupo participava mais de um guerrilheiro zelota. É assim?

JESUS -  Sim, mais que um e que dois.

RAQUEL -  Mas o senhor não optou pela luta armada. Por quê?

JESUS -  A primeira coisa era abrir os olhos e os ouvidos do povo. A águia tem duas garras e com as duas ataca. Meu povo era presa das tropas estrangeiras. Mas não eram só os romanos. Os sacerdotes do Templo também faziam das pessoas reféns do medo. Soldados e sacerdotes: as duas garras.

RAQUEL -  Explique-nos melhor.

JESUS -  Os romanos tiravam o nosso sangue com os impostos e nos aterrorizavam com suas armas. E os sacerdotes nos adormeciam com o deus que pregavam. Haviam construído o Reino do Diabo. Nós anunciávamos o Reino de Deus.

RAQUEL -  Os sacerdotes tinham tanto poder?

JESUS -  Tinham o Templo, um grande negócio: a venda de animais para os sacrifícios, o câmbio de moedas, o comércio das coisas de Deus. Tinham a Lei, um jugo pesado: jejum, esmolas, dízimos. E tinham o medo, Raquel: pregavam um deus castigador que deixava de fora os doentes, as mulheres e os pobres.

RAQUEL -  E as pessoas se resignavam?

JESUS -  As pessoas estavam cegas, surdas, paralisadas.

RAQUEL -  O senhor enfrentou esse poder. Foi um revolucionário?

JESUS -  Eu disse: ninguém por cima de ninguém, todos somos irmãos, todas somos irmãs. E Deus, é o único Senhor.

RAQUEL - E por dizer essas coisas o poder religioso o perseguiu. O senhor se considera um dissidente, um herege?

JESUS - Sim. Quiseram-me apedrejar várias vezes por heresia. Expulsaram-me da sinagoga. E fui condenado à morte pelo Sumo Sacerdote por blasfémia.

RAQUEL - Porém, o senhor foi tolerante com o poder político. O senhor esteve de acordo com o pagamento de impostos ao imperador de Roma.

JESUS -  A que te referes?

RAQUEL -  Refiro-me à sua famosa frase que todos os políticos do mundo citam: “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.” Quer dizer, a César, os impostos e a Deus, os louvores.

JESUS -  Não, eu não disse isso, Raquel. Eu disse: não dêem a César o que não é de César. Foi isso que eu disse.

RAQUEL – Ao contrário, então?

JESUS - A direito. Porque esse homem, o César, julgava-se Deus. Arrogante, soberbo. Mandava gravar sua cara nas moedas. Eu disse: Não dêem a ele o que lhes pede. Ponhamo-lo em seu lugar. É apenas um homem. E a Deus, o que é de Deus. Deus por cima de todos.

RAQUEL -  Então, o senhor não aprovava o pagamento de impostos?

JESUS -  Como ia eu aprovar que o povo pagasse impostos a um império estrangeiro? Como entregar tributos a um homem que se acreditava Deus?

RAQUEL -  E por que distorceram tanto as suas palavras nos evangelhos?

JESUS - Não te disse que os romanos nos mantinham aterrorizados? Parece que àqueles que depois escreveram sobre o Reino de Deus ainda lhes tremiam as pernas frente a Roma.

RAQUEL - Naquele mundo violento, tão parecido ao nosso, qual foi o projecto político de Jesus Cristo? Não percam nosso próximo programa. Raquel Pérez. Emissoras Latinas, Jerusalém.


NOTA – Nesta entrevista, como de resto em todas elas, é nítido o que tem sido o papel e a preocupação da igreja de Roma criada pelo imperador Constantino: um instrumento poderosíssimo ao serviço do poder político e dos interesses materiais em vigor ao longo dos tempos das classes sociais mais altas e com as quais se confundiram sempre os interesses de toda a estrutura hierárquica do Vaticano desde o mais simples sacristão até ao Papa.

Para além de vozes isoladas, arriscadas para os seus autores, que denunciaram todo este esquema de autêntica fraude de consciências humanas, apenas o Concílio Vaticano II, em 1961, pareceu ser um despertar oficial para esta situação.

A Igreja de hoje, com os seus apelos à paz mundial e à justiça social tem um discurso, neste aspecto, certo, mas perdeu força, os poderosos que decidem não lhe dão importância, não ligam ao que ela diz e todo o seu passado e muito do seu presente também não a recomendam…


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