Na genuinidade de Gabriela não cabia a Srª Saad |
GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 128
Também ela sentia por ele uma coisa por
dentro, diferente da que sentia por todos os outros. Com todos os outros sem
excepção, nem mesmo Clemente, mesmo Betinho, era só para dormir. Quando pensava
num moço, para ele se ria, Tonico ou Josué, Epaminondas, Ari, só pensava tê-lo
na cama, em seus braços gemer, morder sua boca, seu corpo fruir.
Por seu Nacib sentia tudo isso também e
mais do que isso. Dele gostava, de ficar junto, de ouvi-lo falar, de cozinhar
comida picante para ele comer, de sentir sua perna pesada na anca, de noite.
Dele gostava na cama para aqui lo que na cama se faz em vez de dormir. Mas não
só na cama nem só por isso. Para o resto também. E para o resto, só dele
gostava. Para ela seu Nacib era tudo: marido e patrão, família que nunca
tivera, o pai, a mãe e o irmão que morrera apenas nascido. Seu Nacib era tudo,
tudo que possuía. Ruim ser casada. Besteira casar. Bem melhor fora antes.
A aliança no dedo em nada mudara seus
sentimentos por seu Nacib. Apenas, casada, vivia a brigar, a ofendê-lo, todo o
dia a magoá-lo. Gostava não de ofendê-lo. Mas como evitar? Tudo quanto Gabriela
amava, ah! era proibido à Srª Saad. Tudo o que a Srª Saad devia fazer, ah!,
essas coisas Gabriela não as tolerava. Mas terminava cedendo para não magoar
seu Nacib, tão bom. As outras fazia escondida para ele não saber. Para não
ofendê-lo.
Bem melhor era antes, tudo podia fazer,
ele tinha ciúmes mas eram ciúmes de homem solteiro, logo passavam, passavam na
cama. Podia tudo fazer sem medo dele ficar ofendido. Antes cada minuto era
alegre, vivia a cantar, os pés a dançar. Agora cada alegria custava tristeza.
Não tinha ela de visitar as famílias de Ilhéus? Ficava sem jeito, vestida de
seda, sapato doendo, em dura cadeira. Sem abrir a boca para não dizer
inconveniência.
Sem rir, parecendo de pau, gostava não.
Para que lhe servia tanto vestido, tanto sapato, jóias, anéis, brincos, tudo de
ouro se não podia ser a Gabriela? Não gostava de ser a Srª Saad.
Agora não tinha mais jeito, porque
aceitara? Para não ofendê-lo? Quem sabe se por medo de um dia perdê-lo?
Fez mal em aceitar, agora era triste,
vivia fazendo o que não lhe agradava. E pior que tudo, para ser Gabriela,
alguma coisa ainda possuir, sua vida viver, ah!, fazia escondido, ofendendo,
magoando. Seu amigo Tuísca nem vinha mais vê-la. Adorava Nacib e tinha porquê.
Raimunda doente, Nacib mandava em sua casa levar dinheiro para a feira. Era bom
seu Nacib.
Tuísca achava que ela devia ser a Srª
Saad, não mais Gabriela. Por isso não vinha, porque Gabriela ofendia, magoava
Nacib. Seu amigo Tuísca nem ele entendia.
Ninguém entendia. Dª Arminda pasmava,
dizia que eram os maus espíritos, ela não qui sera
se desenvolver. Onde se via ter de um tudo e viver com a cabeça em tanta
tolice? Nem mesmo Tuísca podia entender quanto mais Dª Arminda.
Ainda agora, que podia fazer? O fim do
ano estava chegando. Com bumba-meu-boi, com terno de reis, pastorinhas,
presépios, ah!, disso gostava. Na roça saíra de pastorinha. Terno mais pobre,
nem tinha lanternas, mas era tão bom! Bem perto dali, na casa de Dora (na
última casa da subida da rua, onde ela ia provar seus vestidos, um terno, pois
era Dora sua costureira) começavam os ensaios de um terno de reis. Com
pastorinhas, lanternas e tudo. Dora dissera:
-
Para levar a bandeira, o estandarte dos reis, só Dª Gabriela.
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