segunda-feira, dezembro 17, 2012


ISABEL -  Rainha Santa

Um dos seus capelães, que era aragonês, contava-lhe, como se embalasse uma criança, a grande história dos seus avós, os Manfredos, cúpidos e desditosos. Barbaroxa, truculento e maldito e aquela outra princesa, Maria de Montepilher que, esposa enjeitada, uma noite se lançou furtivamente nos aposentos de el-rei, no lugar de certa moça que ali costumava ficar, e ao cabo de nove meses, contados dia por dia, deu à luz um menino que foi o herdeiro do ceptro e veio a morrer num mosteiro, amortalhado num saiote branco de monge.

Mas a Isabel, o que lhe dava gosto, era ouvir histórias da vida dos santos e passagens da paixão e morte de Jesus Cristo e o capelão desfiava-lhe a vida e a obra da sua homónima Santa Isabel da Hungria que ela tomara como modelo de princesa e sua madrinha espiritual para todo o resto da sua vida.

Assim virtuosa, a desabrochar da meninice, foi indicada a D. Dinis de Portugal como a esposa que convinha à sua estirpe e para a perpetuação do reino.

Assinadas as escrituras, meteu-se Isabel a caminho pelas estradas de Aragão e Castela com uma grande e luxuosa companhia, de que faziam parte o Bispo de Valença, altos dignitários e cavaleiros da melhor linhagem.

Lavravam grandes guerras em Espanha derivadas dos ódios de família e por isso, implacavelmente ferozes mas, como que protegida por uma legião de anjos, foi Isabel preservada não só dos perigos como dos enfados, tendo chegado sem novidade à fronteira setentrional portuguesa, Trás-os-Montes.

Por todo o lado foi bem recebida, com cantares e arcos de flores e verdura. Atravessou o Douro de barca e, ora em liteira ora em mula aparelhada com andas para aligeirar a monotonia da jornada, arribou a Trancoso, onde o real cônjuge a aguardava com o séquito mais brilhante e donairoso que pudera tirar da sua corte.

Do lado de fora das muralhas haviam-se improvisado tendas, um grande arraial de toldos para receber e albergar a nobre gente espanhola que a acompanhava bem como aos portugueses.

Durante dias a vida medieval retumbou de festas mas D. Dinis, que era fogoso, tinha pressa em tomar posse da tenra franguinha e logo no segundo dia, festa de São João Batista, se consorciaram na Igreja de S. Bartolomeu.

Casada aos onze anos, botão de rosa sem perfume, não oferecendo ao marido, rapaz na pujança da seiva, natural doidivanas, mais que uma frágil e inerte graça, valeu à rainha o refúgio do exercício da devoção e caridade, na esteira da sua madrinha da Hungria

As crónicas do tempo não rezam de que físico era Isabel mas todos referem que era formosa. Do exame que se fez ao corpo de Isabel, exumado, séculos decorridos, do seu túmulo de mármore, verificou-se que era alta e fina de talhe, rosto comprido. As mãos primavam por finas, os dedos longos e tão branca de tez que nem lírios brancos.

Logo pela manhã rezava matinas e laudes e ouvia na capela missa cantada por exímias vozes. Acabada a missa lia as horas canónicas, as da Virgem Maria e o ofício dos defuntos. Celebrava à tarde vésperas e não se passava dia, recolhida no oratório, que não se entregasse a leituras pias e à contemplação. Jejuava a pão e água.

Pela Páscoa, mandava em segredo vir ao Paço treze pobres, dos mais miseráveis e, posta de joelhos, lhes lavava os pés e servia à mesa. Despedia-os a cada com um folar e uma muda de roupa.

Em tudo, mais parecia uma religiosa do que uma rainha soberana. Logo, de muito cedo, começou a correr mundo a fama dos seus milagres.
(continua)

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