quinta-feira, fevereiro 21, 2013


MESTRE DE AVIS - D. JOÃO I de PORTUGAL E O SEU CONDESTÁVEL
(continuação)



Dito e feito. O alcaide, logo de manhã ao saltar da cama deu com os olhos nas vacas. Um maná do céu. Julgou que fosse gado tresmalhado que se transviasse aos espanhóis ou rapinanço mal feito e correu a trazê-lo para o Castelo com tão jubilosa precipitação que deixou as portas escancaradas e nem sequer lhes pôs guardas.

A gente de Nuno Álvares não fez mais que arremeter para o Castelo desamparado e pôr no olho da rua a mulher e os filhos do alcaide.

A tropa de Nuno era grande e vivia como ele ao deus-dará. Comer, muitas vezes, de grilo. Fartura era em Espanha, nas entradas pela terra dentro, quando arrebanhavam quanto lhes caía debaixo da unha, haveres e mantimentos.

Às vezes, a hoste, via-se em palpos de aranha para trazer para Portugal rebanhos de bois e de suínos. Também aprisionavam gente, sobretudo muchachas. Não faziam, aliás, senão pagarem-se da mesma moeda das incursões que os castelhanos faziam em terras alentejanas e beiroas.

Mas em Portugal, os homens de armas não raro se deitavam com a barriga a dar horas. Acontecia-lhes nos dias grandes matar a fome com figos colhidos nas figueiras. No Inverno não viam para erguer olhos, nem pão, nem fruta.

Nuno dava o exemplo da frugalidade. Comia depois dos outros terem enchido o fole.

Um dia, em que não havia mais que seis pães, apareceram os besteiros ingleses, desvairados pela fome, a pedir de comer. Mandou que lhes dessem os últimos pães que traziam nos alforges e a água das borrachas. Ele e os seus deitaram-se de barriga vazia.

IV


D. João, seguindo à risca os conselhos de Álvaro Pais: dar, prometer, perdoar, ia consolidando a situação. O povo que isentara de impostos de cacaracá e alcavalas mais importunas que rendosas, via nele o defensor do Reino, segundo a boa prosápia portuguesa e, como no caso do assalto frustrado a Sinagoga, a sua palavra era a “última ratio”.

Quando Dª Leonor Teles se retirara para Alenquer e depois para Santarém, a espumar raiva contra Lisboa que ela e os seus gostaria de ver arrasada e a erva a crescer nas ruas, especialmente contra as mulheres de quem jurava vingar-se, o Mestre ficou com as mãos livres.

Ao passo que seus homens continuavam fazendo boa propaganda, ele tratava de pôr da sua banda as forças imponderáveis espirituais.

Mandava ao mesmo tempo pedir auxílio ao Rei de Inglaterra e dessa iniciativa partiu, em última análise, a aliança inglesa através dos séculos e o casamento dele com a filha do Duque de Lencastre.

A revolução no país prosseguia entretanto a sua marcha avassaladora. A nobreza, de uma forma geral tomava partido por Dª Leonor Teles, ou pelo rei de Castela, herdeiro presuntivo do trono por sua mulher Dª Beatriz, filha de D. Fernando. O povo, pelo Mestre de Avis.

No Porto, a revolução assumira as proporções de um profundo sismo social. A arraia saqueara as casas e armazéns dos partidários da rainha, matara e incendiara.

Depois, a palavra de ordem em relação à ameaça castelhana, corporizada numa invasão, era esta:

 . «Todos deviam aventurar-se a morrer sobre tal demanda antes que a cair em servidão tão odiosa»
(continua)

Site Meter