MESTRE DE AVIS -
D. JOÃO I DE PORTUGAL
E O SEU CONDESTÁVEL
(continuação)
O Mestre mandava cunhar
moeda com prata que lhe vinha de todas as procedências, sinagoga, corporações,
clero, contributo avaliado em 287 marcos de prata de cálices, castiçais,
cruzes, da catedral e de vinte igrejas da diocese.
Dª Leonor, equi vocada com a insurreição popular, não tomava bem
a sério o Mestre. – “Mestre?” – dizia ela - «Não sei se he mestre de trons, se
de bombardas!» E atiçava o Rei de Espanha a pôr cerco a Lisboa, como fez.
Este cerco e o de Almada
são dois capítulos, dignos da Odisseia, à conta do herói e infeliz povo da
capital. Esfomeado, quase não tendo uma côdea para roer, do alto das muralhas
cantavam as raparigas para os castelãos, gordos, nédios, com o arraial bem
provido de tudo, até de «ruas de mundanárias» por uma pá velha:
Esta he Lisboa prezada
Mirala e deixalla
Valeu ao Mestre de Avis a
peste começar a dizimar o exército castelhano. Tiveram de levantar o cerco e
encetar a guerra de movimentos e aí pôde o Mestre mostrar a sua firmeza, raça e
um grande coração animado pelo desejo de cavaleiros feitos.
Cabia agora a Nuno Álvares
tomar o lugar de relevo com a estratégia nova aprendida com tácticos
estrangeiros.
Algumas vezes, os homens
de armas vinham conjurar Nuno a que não cometesse tal ou tal empresa, que havia
azar. Assim pretenderam demovê-lo de atravessar o Tejo quando a frota
castelhana cercava Lisboa pelo rio.
- Não vedes, senhor – dizia-lhe um bom
escudeiro – que sonhei que vos prendiam…
E Nuno responde:
- Pois ficai vós em paz com o vosso sonho; eu
cá vou…
E, embarcando, passava a
luz das estrelas por entre os batéis inimigos, sem desmancho, imune a agouros.
Aljubarrota foi a hora
culminante de Portugal e a batalha que sagrou definitivamente um reino, uma
nacionalidade e uma autarqui a
política na Península ibérica.
Era véspera de Santa Maria
de Agosto e a manhã estava límpida se bem que desabrida. Soprava do mar um
vento agreste que erguia o pó das terras aradas e cirandava no ar.
Os portugueses esperavam a
pé quedo, formados em quadrilátero no local onde hoje se ergue a capela de São
Jorge, ao centro os carros, nos flancos a infantaria portuguesa e inglesa mais
ou menos couraçada, em que se integrava uma boa parte da cavalaria, para o que
os cavaleiros haviam desmontado e os pajens seguravam os cavalos à rédea,
prontos para o que desse e viesse, e ainda esquadrões em forma, atentos à voz
de carregar.
O exército português
apoiava a sua manga direita e um pequeno curso de água seco que riscava o
terreno como uma cicatriz, a sinistra descia a falda de um cerro, e tinha a
frente voltada para Leiria.
Mas os espanhóis não
atacaram por ali. Flagelava-os o vento e, no intuito de lhes voltarem as
costas, descreveram um arco de circo que os levou até Aljubarrota.
(continua)
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