DO
CARNAVAL
Episódio nº 14
José Augusto é que não
viera mais ao bar. E nos dias que passara na Bahia não se cansara de falar mal
de Pedro Ticiano. Por um motivo simples. Conversavam animadamente quando José
Augusto, segundo o seu costume, começara a fazer a apologia de Rui Barbosa.
Ticiano dissera sorrindo:
- Na Bahia só existem dois santos: Senhor de
Bonfim e Rui Barbosa…
O outro abraçou-o,
entusiasmado.
E Ticiano, mau, concluiu:
- E eu não admiro nem adoro nenhum…
- Boa! Muito boa! – bradou Paulo Rigger, rindo
muito da cara de espanto de José Augusto.
E o diplomata não
aparecera mais. Também ninguém mais se lembrou dele.
Paulo Rigger, na Bahia,
admirava-se de tudo. A cidade de Tomé de Souza dava-lhe a impressão de uma
daquelas cidades de decadência, onde tudo morre aos poucos, numa tristeza
enorme de deixar a vida.
Chegara à Bahia num dia de
grande animação. No mesmo navio que ele viajavam alguns oposicionistas que iam
em caravana de propaganda eleitoral fazer discursos no norte.
Ao tomar o automóvel com
Julie, já os oradores seguiam pela cidade. Acompanhava-os grande massa popular.
É que entre os caravaneiros, vinha um deputado considerado o maior orador do
país. E o brasileiro dá a vida por uns tropos de retórica.
O automóvel em que ia teve
de fazer parte do cortejo. Impossível romper a multidão. Ele não se incomodou
muito. Interessava-lhe aqui lo tudo,
achava tudo novo e gozava o entusiasmo popular.
De cinco em cinco minutos
o cortejo parava. Um popular qualquer, exaltado, fazia um discurso. Diziam que
«haviam de colocar o voto branco na urna preta». Como Rigger risse dessa frase
foi quase agredido.
No alto da Ladeira da
Montanha, a multidão parou pela sexta vez. Um bêbado fazia um discurso,
forçando por equi librar-se. Mas que
sacrifício não faria ele pela pátria?
E bradava:
- Eu sou o orador da canalha das ruas! O
orador dos mendigos, dos cegos que pedem esmola, dos aleijados (ampararam-no
para não cair), da lama, dos esgotos, das prostitutas… Pela minha boca, ilustres
caravaneiros, saúdam-vos os prostíbulos, os hospitais, a podridão das vilas…
“O maior orador do país
agradeceu, emocionado, a saudação dos cegos, dos aleijados, das rameiras e da
lama das ruas…
O cortejo seguiu aos vivas
e morras.
Paulo Rigger disse a
Julie:
- Minha filha, este é o País do Carnaval.
E sentiu-se estranho,
muito estranho ao seu povo. E começou a pensar que era capaz de fracassar no
Brasil…
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