sexta-feira, março 08, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 41

Toda a prostituta tem uma tragédia, Jerónimo. Quer ver?

E Pedro Ticiano chamou a mulher que passava.

 - Minha filha, conte aqui para nós, para mim e para este amigo que é o último romântico, como você veio para esta vida, esta terrível vida que as mulheres casadas chamam de fácil…

Ela não se fez rogada. E começou a contar, os olhos baixos, amassando com os dedos a ponta do casaco, quase envergonhada.

Bonitinha aquela mulher! Dois grandes olhos espantados e uma boca pequena onde brincava um sorriso fácil de oferecimento. Nada de aristocrático. O tipo da camponesa bonita.

Tudo igual à das outras… Vivia lá na Nazaré com os pais. Cozia. Ganhava até dinheiro. Um dia, um homem rico e elegante que fora passear na cidade prometera-lhe casamento, casa bonita, automóveis.

Naquele tempo ela ainda acreditava nos homens. Depois, deixara-a perdida, odiada pela família. Viera então para a Bahia. E aí estava a sua história. Igual às das outras…

 - Vivendo a tragédia das prostitutas que nasceram para mães de família. Em todo o caso, minha filha, você escapou de ter sofrido uma tragédia muito maior, a de ter morrido virgem…

Jerónimo apertou as mãos. Teve ódio de Ticiano. Aquele homem só vivia de gozar a desgraça dos outros. Um miserável…

Pedro Ticiano afastava-se lentamente. A rameira, parada, continuava mergulhada nas suas recordações. Tão bonitinha! Jerónimo sem que Ticiano o visse, deu-lhe 20$000.

 - Obrigado. O senhor é tão bom…


O bar estava cheio. Pelas mesas espalhavam-se os bons burgueses trabalhadores que engoliam voluptuosamente o seu chope. Ticiano falava alto, escandalizando um grupo de políticos.

Recitava epigramas. Pequenas caricaturas dos grandes talentos da Bahia. Um Bêbado entrou no bar. Havia um pretexto para não dar a esmola. O homem iria beber cachaça…

Ticiano chamou-o. Deu-lhe dez tostões.

 - Toma desgraçado. Metade do que tenho agora no bolso.

 - Eu não vou beber, não senhor.

 - Cale-se estúpido! Eu quero que você beba… Tem de beber.

Você gosta de álcool, não é? Então beba. A gente deve satisfazer sempre os nossos instintos… Eu gosto dos bêbados porque são anticoncepcionais.

O ébrio, sem compreender, saiu às cambalhotas.

 - O homem então deve ser escravo do instinto? – discordava José Lopes.

Você prefere ser das convenções, não é?

Pedro Ticiano morava agora com o filho. Piorara muito da vista e sentia um enfraquecimento geral. A morte chegava. O espírito de Ticiano continuava o mesmo. Sempre o mesmo jornalista de combate, o epigramista fino.

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