DO
CARNAVAL
Episódio Nº 42
O filho não queria que ele
escrevesse mais. Devia deixar daquela vida. Recolher-se à casa, não sair,
abandonar as conversinhas diárias.
Para que estava ele a
escrever diariamente um artigo e ainda notas? E demais, mal pago… Gomes
roubava-os. Pagava mal a todos eles, que o serviam como amigos, e enriquecia.
E Ticiano queixava-se:
- Quando eu tinha dezoito anos, meu pai
perseguia-me por causa das minhas veleidades literárias. Agora persegue-me o
filho…
Ricardo Braz juntou-se ao
grupo. Acabara de levar a bordo o tal político da sua terra. O homem seguia
encantado. A nota “do Estado da Bahia”, com cliché, então… Um sucesso!
- Prometeu-me tudo, o homem1 A Ruth vai ficar
contentíssima…
- Você e Rigger são uns imbecis! Vão casar.
Vão meter-se na mais completa mediocridade. Vocês casam, vamos ser sinceros,
para possuir as respectivas noivas. Depois que saciarem o sexo…
- Mas você engana-se redondamente quando pensa
que nós casamos unicamente para poder dormir com as nossas noivas. Casamos
porque temos necessidade de carinho. Queremos sexo e coração…
- E antes de vocês se saciarem do sexo, se
sacarão do coração. Eu já fui casado…
- Qual nada! Nós sentimos que esse amor é a
nossa finalidade.
José Lopes bateu na testa.
Uma coisa que trouxera para lhes mostrar. Afinando a voz, leu:
“Mademoiselle Sentimento –
Mademoiselle Sentimento, eu te amo tanto… Eu te adoro. Por que é que os teus
olhos fogem dos meus olhos, quando conversamos? Por que essa tristeza que às
vezes faz pálida a tua face? Por que não me contas tudo, não me abres
inteiramente a alma, Mademoiselle Sentimento? Bem sabes que eu te amo tanto…”
- Quem é que escreveu esse amontoado de
besteiras?
- De lugares comuns…
- É a crónica social de amanhã.
- Você escreveu isto, Ricardo?
- Não. Rigger pediu-me para eu fazer a crónica
amanhã.
- Paulo Rigger, tão panfletário… tão violento…
- Sim. Paulo Rigger que, noutros tempos,
escrevia o “Poema da Mulata Desconhecida”…
- Coitado!
- Está perdido o rapaz…
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