quinta-feira, março 14, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 46

Andaram muito tempo na rua sem pronunciarem uma palavra. Ele temia a revelação que Maria de Lourdes prometera fazer. Ela não se sentia com coragem para lhe contar tudo. Ele criou ânimo:

 - Conte, noivinha…

Soluçando baixinho, ela contou. Não era mais moça. Disse-lhe do seu amor por Osvaldo e, como ingénua, se lhe entregara sem saber o que fazia. Digna de perdão. Mas não lhe contara ainda porque tinha medo de que ele não a perdoasse. Perdoaria?

Ele, numa monstruosa volúpia de sofrer, fê-la narrar tudo nos mínimos detalhes.

Sentiu que as luzes da cidade se apagavam aos poucos. E aos poucos, na sua alma ia vencendo a treva. A Felicidade fugia. Estava toda escura a cidade.

Maria de Lourdes dependurou-se-lhe no pescoço, mordendo-lhe nos lábios. A luz voltou violentamente para as lâmpadas eléctricas. Mas a alma de Paulo Rigger continuava em trevas.

Disse como um ébrio:

 - Vamos…

Acompanhou-a até casa. Deixou-a no patamar da escada, chorando.

E saíu aspirando o ar com força, numa vontade doida de esmurrar os transeuntes, de cuspir na cara das mulheres, de dizer palavras feias…

Os amigos estranharam-lhe o rosto.
Perguntaram-lhe o que tinha. “Nada, nada. Que o deixassem, pelo amor de Deus.” Pediu cachaça à garçonete. Bebeu muito. E pelo fim da noite, chorando de raiva, contou a sua infelicidade aos amigos.

- E agora, o que você vai fazer? – perguntou Jerónimo.

- Sei lá! Sei lá! Tenho cabeça para pensar?... Nem quero pensar o que farei!

Ricardo achava que o melhor que ele fazia era casar. A melhor resolução. Maria de Lourdes devia ser sincera. Ele casasse. Não era tão anti-convencional?

- A gente não pode vencer a convenção assim tão facilmente – objectou José Lopes. – Ela trás a força de dezanove séculos de vida!

É uma herança terrível…

 - Você tem razão, José. Eu não posso vencer a convenção. Sinto que ela é digna do meu amor, mas sou incapaz de casar com ela. Animal que sou, deixo fugir a minha Felicidade…

Acompanharam-no a casa. Ricardo Braz ficou para dormir com ele. Podia querer fazer uma loucura à noite…

Conversaram todo o resto da noite. Paulo Rigger decidira-se a procurar no outro dia Maria de Lourdes e casar-se. Por que não?


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