terça-feira, março 19, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 50


O rompimento, inevitável, dera-se. O Gomes brigara com Pedro Ticiano. Os demais, num gesto de solidariedade, acompanharam Ticiano, apesar de reconhecerem que o director comercial do “Estado da Bahia” tinha razão.

Quando Paulo Rigger chegou do Rio, José Lopes contou-lhe o caso:

 - Avalie que nós conversámos sobre o Carnaval. Ricardo afirmava ser impossível escrever hoje um conto de Carnaval com alguma originalidade. Sempre a mesma repetição. Um pai dá inteira liberdade à filha e num carnaval encontra uma máscara atraente, leva-a para um quarto e, quando a despe, reconhece a filha.

E, naturalmente, em vez de filha, pode ser a esposa, a irmã, a avó… Mas sempre a mesma coisa…

 - Sim.

 - Eu apoiava Ricardo. Ticiano comprometeu-se a fazer um conto carnavalesco original. Apostamos. E no outro dia…

 - O que foi que teve?

 - O “Estado da Bahia” publicou o conto que deu lugar ao rompimento.

 - Original?

 - Originalíssimo. Mais do que isso, imoral. Sabe o conto que Ticiano escreveu? Um viúvo tinha três filhos. O primeiro, já rapaz, frequentava uma academia e alguns campos de futebol. O segundo, não era um filho, era uma filha. E o mais moço, garoto de uns catorze anos, internara-o o pai num colégio.

A filha, educada à americana, usava e abusava da liberdade que lhe davam. Vem o Carnaval. Ticiano descreveu maravilhosamente a “festa do instinto”. O velho mete-se numa máscara e sai para a pândega. A família toda já saíra. Só o filho mais moço devia estar a dormir no internato.

Num baile onde se jogara, o viúvo vê um lindo pierrô. Formas perfeitas, divinas… Dançaram, beberam, conversaram. Meia-noite dirigiram-se para um aposento. O velho, repentinamente, suspende a máscara da sua companheira e reconhece, horrorizado….

 - … a filha? Igual aos outros!

 - Não, homem. O filho! O que estava interno. Fugira do colégio, alugara uma fantasia, e viera dançar…

- Quá, quá, quá!

Gomes danou-se quando leu o conto publicado. “Uma coisa homossexual que desmoralizava o seu jornal.” Discutiram. Ticiano zangou-se e resolveu sair.

Quisemos conseguir as pazes. Gomes nos tratou mal. Saímos também, solidários com Ticiano.

 - Que cachorro, aquele Gomes! Afinal, deve tudo quanto é a você, José Lopes. Quando só tinha a Bahia “Nova” você o sustentava. E agora…

 - E Ticiano que deu o nome ao “Estado da Bahia”?

 - Cachorro!

 - Canalha!

 - Eu sempre disse que ele não prestava – lembrou Jerónimo.

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