quinta-feira, março 21, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 52

E quase sempre terminava por tomar o automóvel e ir para casa de Ticiano conversar.

Ticiano já não saía. Quase completamente cego, mal podendo caminhar pela casa. Ajudava-o uma neta, garota de treze anos que fugia mal avistava Paulo Rigger. Aqueles dois homens conversavam muito. Pedro Ticiano, “blagueur”, ria da insatisfação de Paulo:

 - Porque você não chega à religião, rapaz?

 - Sei lá! Talvez chegue mesmo…

 - Ora, Rigger, deixe isso. Procure viver para a dúvida. Viver para o sofrimento. Para a própria insatisfação. Em vez de combater a dúvida, adorá-la. Eu duvido de tudo.

 - Até da dúvida?

 - Principalmente da dúvida…

 - Eu sei, Ticiano, que você achou a solução do problema. Por que a guarda tão avaramente? Por que não no-la ensina?

 - Eu tenho dito tantas vezes! A solução é não querer solucionar…

 - Blague…

- Então é…



Pouco se encontravam ultimamente. Paulo Rigger ensimesmado, só procurava Ticiano. José Lopes, bebendo muito, enterrado entre livros de filosofia, não trabalhava e mudava constantemente de pensão.

Cada vez que saía de uma, ia para outra pior. Magro, insatisfeito, odiando a vida, lia cada vez mais, a ver se, entre as páginas de Kant e de São Tomás, encontrava a Felicidade.

 - Só na filosofia…

Mas Ricardo Braz discordava:

 - Só no amor, no casamento…

E Ricardo Braz casou-se. Paulo Rigger e José Lopes serviram de testemunhas. Paulo oferecera-lhe a fazenda para passar a lua-de-mel. Depois iria para uma cidadezinha do interior longínquo do Piauí.

Infeliz – murmurava Ticiano.

Jerónimo Soares libertava-se aos poucos da influência de Pedro Ticiano. Começava a ser feliz. Passava as noites com a rameira que encontrara naquele dia com Pedro Ticiano.

Fazia projectos de morar com ela na mais completa felicidade… Aparecia raramente. Mas, nos dias em que visitava Ticiano, botava abaixo todos os seus sonhos ao ouvir as blagues do amigo.

 E pensava em ser como Pedro, um indiferente, superior, mau, destruidor de ilusões.

À noite, porém, entre os braços dela, esquecia Ticiano. E ao seu pensamento voltava a imagem de uma casinha, muito amor, muito carinho, o sorriso bom dela, a mais completa felicidade.

E lutava contra a influência de Pedro Ticiano. Temia não poder vencê-la. Se não a vencesse, seria infeliz toda a vida… nunca a realizaria os seus sonhos, nunca teria coragem de ser feliz…

E Pedro Ticiano que achava aquilo tudo tão ridículo…

Site Meter