do 25 de
Abril de 1974
Impossível não
assinalar esta data, 25 de Abril de 1974, porque ela celebrará sempre o dia
histórico em que o “ Movimento dos Capitães” derrubou o regime que durante mais
de quarenta anos perseguiu os cidadãos com a PIDE, polícia política que prendia
e castigava as pessoas que discordavam do regime e manifestavam essa
discordância e possuía a Censura que impedia que as ideias circulassem na
imprensa, nos livros e oralmente entre as pessoas.
Por outras palavras, restabeleceu no
país a liberdade. Esta é a responsabilidade que cabe ao 25 de Abril, à Revolução
que, felizmente, foi dos Cravos e que deve ser imputada ao Movimento dos
Capitães do MFA, cidadãos que nela se envolveram e a levaram à prática, sem
esquecer o contributo que ao longo dos anos foi sendo dado por muitas outras
pessoas.
Restabelecida a liberdade, tudo o que
de então para cá aconteceu no país é da responsabilidade dos portugueses e das
conjunturas políticas que desde então vivemos.
Um povo só pode ser responsabilizado
plenamente pelo curso da sua história nos períodos em que os cidadãos não vivam
oprimidos por um poder que os ameace na sua liberdade e integridade física.
Numa situação destas há uma distorção forçada dos comportamentos que alteram o
rumo da história que inevitavelmente seria outra se vivida em liberdade.
Acusar o 25 de Abril do que quer que
seja para além do restabelecimento da liberdade no país, só se entende por
juízos precipitados, falta de discernimento ou por um comprometimento directo
com interesses ligados ao regime anterior por quem, com essas acusações,
pretenda uma pequena vingança.
Esperar-se-ia que as forças militares
que derrubaram pela força o poder anterior pretendessem, após isso, exercê-lo,
não obstante as desinteressadas intenções sempre anunciadas em situações deste
género mas, em vez disso, o poder militar vitorioso chamou representantes da
sociedade civil e encarregou-os de constituir um governo livre e democrático.
Na história das revoluções esta mais
parecia uma história da carochinha em que no final o jovem herói casa com a
princesa, tem muitos filhos e são felizes para sempre… mas desta vez não foi
história de “princesas”.
O
Movimento dos Capitães, responsável pela revolução, após a vitória, chamou um
General insuspeito de revolucionário e pediu-lhe que assumisse o controle da
situação tendo em vista a passagem a uma situação transitória de elaboração de
uma nova Constituição que antecedesse eleições livres e democráticas.
A pureza dos ideais do 25 de Abril
estava consumada e os jovens capitães mantiveram-se fiéis à sua palavra
comprovando que se a juventude se caracteriza, naturalmente, pela ingenuidade e
imaturidade, neste caso ela provou ser pura, desinteressada, generosa e
sincera.
Realçado este aspecto essencial do 25
de Abril, muitas coisas aconteceram de então para cá de erradas, que nos
prejudicaram, que foram motivo de grandes “confusões”, especialmente no período
do PREC (Período Revolucionário Em Curso) mas que constituiram, também, uma
fase de grande efervescência ideológica, voluntarismo e de um despertar depois
de tantos anos de “um apagado e vil silêncio”.
Passamos a viver numa democracia de
partidos políticos, forma adoptada pela generalidade dos países europeus, com
as especificidades próprias do temperamento, cultura e educação de cada um
deles. Como dizia Churchil: “de todos os regimes o menos mau...”.
E quem não tem queixas da democracia
em que vive? Quem não atribui aos políticos que nos governam as origens dos
males que nos afligem? Quem não os responsabiliza, com ou sem razão, esquecendo
que no mínimo somos nós que os elegemos e com isso nos tornamos
co-responsáveis de tudo quanto acontece?
Depois, foi a “inevitável” integração na Comunidade Europeia que nos abriu as
fronteiras alargando o nosso espaço económico, financeiro e de trabalho, com
uma nova moeda, esquecido que foi o escudo, com a entrada de milhões de euros,
em grande parte responsáveis por esta “nova cara” do país mas que desmantelou,
por responsabilidade nossa a agricultura, as pescas e uma indústria
desmotivada.
Todos
temos que assumir a nossa quota-parte de responsabilidade quando vivemos em
liberdade numa sociedade que não nos persegue, prende e castiga pelas nossas
ideias e comportamentos no respeito por um quadro legal que livremente
estabelecemos.
Mas, se compararmos uma sociedade a
um enorme e complexo computador, logo nos lembraremos dos vírus que os afectam
e dos quais nenhum está livre. Nesse outro enorme “computador” que é a nossa
sociedade, o principal vírus foi o da “partidocracite” com corrupção, tráfego
de influências, negócios misturados com política…
A corrupção e o enriquecimento
ilícito que lhe está associado têm a ver, fundamentalmente, com pessoas e o
exercício do poder. Os partidos, especialmente os que alternam no governo, têm
os meios e estrita obrigação de lutar contra ela, colocando-o no Código Penal
como um crime, perseguindo-o e punindo-o exemplarmente mas não o fizeram…
Ninguém ainda foi condenado e preso por ser corrupto e beneficiar do tráfico de influências.
A “partidocracite”, empolando os
interesses dos respectivos partidos, na defesa ou na luta pelo poder,
sobrepondo-os aos da comunidade, confundindo-os com os do país, é infelizmente de uso corrente na maioria das sociedades democráticas,
salvaguardadas as legítimas opções políticas com que cada partido se apresenta
ao eleitorado.
Reconheçamos que a luta contra este
vírus é muito difícil porque ele se disfarça e aparece revestido de muitas
formas que confundem os cidadãos.
Celebrar hoje o 25 de Abril de 1974,
é confrontarmo-nos com aqui lo que fomos
e não fomos capazes de fazer no quadro de liberdade que ele nos devolveu, já lá
vão trinta e nove anos.
Naturalmente, que a ditadura de
Salazar deixou um quadro pouco favorável ao nosso desenvolvimento futuro,
fundamentalmente em termos culturais e de mentalidade. Todos sabemos que as
ditaduras são castradoras e isso tem um enorme preço no futuro pela falta de
formação e responsabilização das pessoas.
Não
mais as legítimas desculpas da Censura, das perseguições da Polícia Política,
do medo da denúncia, do analfabetismo, das fronteiras passadas a salto, do
silêncio, da ignorância do mundo, não mais… de tudo isso ficou-nos a liberdade
que a Revolução dos Cravos nos trouxe.
E
hoje, passados estes 39 anos, encontramo-nos nesta terrível encruzilhada de não
sabermos como avançar e ao mesmo tempo ter medo de voltar a trás.
Fazer
prognósticos do nosso futuro político está hoje ao sabor do estado de espírito
de cada um… os pessimistas dirão que o país irá desaparecer no turbilhão das
suas dificuldades financeiras, retalhado pelos credores… os outros, os
optimistas, avisam que Portugal já cá está há muitos séculos ao longo dos quais
passou por tudo o que é mau: pestes, fome, invasões, guerras.
Pais de emigração, contando com os seus descendentes, vivem hoje no estrangeiro, mais de 15 milhões de portugueses, e esta tem sido a principal forma de resistir...
Diremos que, resistir,
está-nos na massa do sangue.
Mais
uma vez assim será. Daqui a um ano
cá estarei para vos falar da Revolução dos Cravos, a do 25 de Abril de 1974.
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