segunda-feira, maio 20, 2013


JUBIABÁ

Episódio Nº 20


Ainda tinha diante dos olhos a figura de Joana, as lágrimas caindo, entrando pela boca. Depois ficou amarrado no pé da mesa e aos poucos o gozo foi acabando. Então, como não tinha o que fazer ficou brincando de matar formigas.

Um vizinho disse:

 - Menino judeu… Esse acaba criminoso…


Não virou lobisomem. Porém foi obrigado a lutar com uns dois garotos e a rebentar a cabeça de um terceiro para conseguir recuperar o seu prestígio entre os moleques do morro.

Prestígio que ficara seriamente abalado com ele não se ter conseguido transformar em assombração. Também o outro lobisomem desapareceu, depois que Jubiabá fez uma reza forte na força da lua cheia, de cima do morro, acompanhado de quase todos os habitantes.

Rezou com um ramo de folhas, mandou que o bicho fosse embora, depois jogou o ramo na direcção em que o lobisomem fora visto e a assombração voltou para o lugar de onde viera e deixou em paz os moradores do Morro do Capa Negro. Nunca mais o lobisomem voltou. Mas ainda hoje se fala dele nas conversas do morro.

Jubiabá, que ninguém sabia quantos anos carregava no costado e que morava no Morro do Capa Negro muito antes de lá haver qualquer outro daqueles habitantes, explicou a história do lobisomem:

 - Ele já apareceu muitas vezes. Já fiz ele ir embora um bocado de vez…Mas ele volta e tem de voltar enquanto não pagar os crimes que cometeu aqui em baixo. Ele há-de voltar muitas vezes ainda…

 - Quem é ele, pai Jubiabá?...

 - Ah! ocês não sabe… Pois ele é senhor branco que era dono de uma fazenda. Isso foi nos tempos passados, nos tempos da escravidão de negro.

A fazenda dele ficava bem aqui onde nós mora agora. Bem aqui. Ocês não sabem porque este morro se chama do Capa Negro? Ah! ocês não sabe…Pois é porque esse morro era fazenda desse senhor. E ele era homem malvado.

Gostava que negro fizesse filho em negra para ele ganhar escravo. E quando negro não fazia filho mandava capar negro… Capou muito negro… Branco ruim… Por isso esse morro é do Capa Negro e tem lobisomem nele.

O lobisomem é senhor branco. Ele não morreu. Era ruim demais e uma noite virou lobisomem e saíu pelo mundo assustando gente.

Agora ele vive procurando o lugar da casa dele que era aqui no morro. Ele ainda quer capar negro…

 - Deus t’esconjure…

 - Ele que venha me capar que ele vai ver – Zé Camarão ria.

 - Negro que ele capou era avô, bisavô de nós… Ele procura nós pensando que ainda somos escravos dele.

 - Mas negro não é mais escravo…

 - Negro ainda é escravo e branco também – atalhou um homem magro que trabalhava no cais – todo pobre é ainda escravo. Escravidão ainda não acabou…

Os negros, os mulatos, os brancos baixaram a cabeça. Só António Balduíno ficou com a cabeça erguida. Ele não ia ser escravo.


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