quarta-feira, maio 22, 2013


JUBIABÁ

Episódio Nº 22



E com mais medo ainda ficou quando o viu morto, com duas facadas no peito. Nunca se soube quem foi o assassínio. Porém, um ano depois, certo dia, Balduíno estava correndo pela ladeira quando um homem de calça rasgada e chapéu furado, cara de doente se aproximou e perguntou:

 - Oh! Menino mora aqui um homem chamado Leopoldo? Um negro alto, sério…

 - Já sei… não mora mais, senhor…

 - Já se mudou?

 - Não. Morreu…

 - Morreu? De quê?

 - De facada…

 - Assassinado?

 - Foi, sim senhor…

 Olhou o homem…

 - O senhor era parente dele?

 - Quem sabe? Me diga, qual é o caminho da cidade?

 - O senhor não quer ir lá em cima saber mais nada? Titia pode lhe dizer… E eu lhe mostro a casa onde seu Leopoldo morava… Agora é de seu Zeca…

O homem tirou da calça rota uma nota de quinhentos reis e deu a Balduíno.

Olha, garoto, se ele não estivesse morto morria hoje…

E desceu a ladeira sem esperar resposta. António Balduíno desceu correndo atrás do homem:

 - O senhor não quer saber o caminho da cidade?

Mas o homem nem olhou para trás. António Balduíno não contou este encontro a ninguém de tanto medo que ficou. E em sonhos a imagem do homem de chapéu furado o perseguiu muito tempo.

Parecia que ele vinha de muito longe e estava cansado. António Balduíno pensou que o olho da piedade daquele homem tinha vazado.


Um, dois, três anos se passaram naquela vida do morro. Os habitantes eram os mesmos, a vida a mesma. Nada mudava. Só as dores de cabeça de Luísa aumentavam. Agora haviam passado a ser quase diárias, pegando a negra logo que ela voltava da venda nocturna do mungunzá e do mingau.

A negra ficava gritando, botava os vizinhos para fora, vinha Jubiabá e cada vez demorava mais a curar as dores de Luísa. A velha andava esquisita: chegava da rua furiosa, berrando, zangando por tudo, batia em Balduíno por qualquer nada que ele fazia, e depois quando a dor melhorava, pegava no sobrinho, botava no colo, catava cafuné na carapinha, chorava baixinho, pedia perdão.

António Balduíno vivia apalermado, sem entender. Achava a tia incompreensível, com aqueles acessos de raiva e de carinho.

E nas brincadeiras, de quando em vez, parava para pensar na tia, na dor de cabeça que a estava matando. Sentia que em breve a perderia e isso confrangia o seu pequeno coração que, no entanto, já estava tão cheio de amor e ódio.

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