quinta-feira, junho 06, 2013

JUBIABÁ

Episódio Nº 35


O menino é macho, ninguém bole nele…

 - E se eu bulir?

António Balduíno sentia que estavam todos do seu lado:

 - Pois bula…

Levantou-se. O Sem Dentes também. Pensava que se vencesse António Balduíno chefiaria os moleques. Ficaram olhando um para o outro.

 - Bata – disse o Sem Dentes.

António Balduíno arrumou o soco. O Sem Dentes vacilou mas não caiu. Se atacaram, a molecada torcendo. O Sem Dentes estava por baixo mas deu um jeito e se pôs em pé. Um soco de António Balduíno o pôs novamente no chão.

Quando o Sem Dentes se levantou vinha com um canivete aberto, brilhando no escuro.

 - Covarde, não sabe brigar como homem…

O Sem Dentes veio com o canivete, mas António Balduíno tinha aprendido capoeira com Zé Camarão no Morro do Capa Negro. Jogou as pernas, o Sem dentes se estatelou no chão, o canivete voou longe.

António Balduíno concluiu:

 - Se bulir com o menino bole comigo… De outra vez tomo o canivete…

O Sem dentes dormiu sozinho numa porta. Filipe, o Belo, ficou definitivamente no grupo.

Era especialista em velhas. Mal aparecia uma no princípio da rua, ele consertava o laço da gravata velha que nunca abandonava, jogava fora a ponta do cigarro, metia as mãos nos bolsos fundos, escondia a navalha e se aproximava muito triste. Falava baixinho:

 - Bom dia, senhora. Eu sou um menino abandonado, sem pai, sem mãe. Não tenho ninguém por mim... Tenho fome…Estou com tanta fome…

Começava a chorar. Possuía um talento especial para chorar na hora que queria. As lágrimas caíam, soluçava alto:

 - fome… mamãe… a senhora tem filho… tenha pena… mamãe…

Ficava lindo chorando, o rostinho redondo e alvo cheio de lágrimas, os lábios tremendo. Não havia mulher que não dissesse.

 - Coitadinho… Tão pequenininho… Já sem mãe…

Davam-lhe largas esmolas. Três vezes foi convidado a morar em casas ricas de senhoras ricas. Mas amava a liberdade das ruas e permanecia fiel ao grupo, onde já era elemento respeitadíssimo, pois dos mais eficientes.

Até o Sem Dentes o tratava com respeito quando ele voltava de junto de uma velha.

 - Caiu com cincão…


A gargalhada dos moleques estrugia pelas ruas, ladeiras e becos da cidade da Baía de Todos os Santos e do Pai de Santo de Jubiabá.

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