sexta-feira, junho 28, 2013

JUBIABÁ

Episódio Nº 54



MACUMBA

Foi feito despacho de Exu, para que ele não viesse perturbar a boa marcha da festa. E Exu foi para muito longe, para Pernambuco ou para África.

A noite caía pelos fundos das casas e era aquela noite calma e religiosa da Baía de Todos os Santos. Da casa do pai de santo Jubiabá vinham sons de atabaque, agogô, chocalho, cabaça, sons misteriosos da macumba que se perdiam no pisca-pisca das estrelas, na noite silenciosa da cidade. Na porta, negras vendiam acarajé e abará.

E Exu, como tinham feito o seu despacho, foi perturbar outras festas mais longe, nos algodoais da Virgínia ou nos candomblés do morro da Favela.

Num canto, ao fundo da sala de barro batido, a orquestra tocava. Os sons dos instrumentos ressoavam monótonos dentro da cabeça dos assistentes.

Música enervante, saudosa, música velha como a raça, que saía dos atabaques, agogôs, chocalhos, cabaças.

A assistência, apertada em volta da sala, junto à parede estava com os olhos fitos nos “ogans” que ficavam sentados em quadrado no meio da sala. Em torno dos “ogans” gritavam as “feitas”.

Os “ogans” são importantes, pois eles são sócios do candomblé e as “feitas” são as sacerdotisas, aquelas que podem receber o santo.

António Balduíno era o “ogan”, Joaquim também, mas o Gordo ainda não era e estava a meio da assistência, bem junto de um homem, branco e magro, calvo, que espiava a cena muito atento, procurando acompanhar a música monótona com pancadas nos joelhos.

Do outro lado, um jovem negro de roupa azul estava envolvido pela música e pelos cânticos, esquecido que tinha vindo observar.

O resto da assistência era formada por homens pretos, homens mulatos que se apertavam contra negras gordas, vestidas com anáguas e camisas decotadas e colares ao pescoço. As “feitas” dançavam lentamente, sacudindo o corpo.

De repente, uma negra velha que estava encostada à parede da frente, perto do homem calvo, e que de há muito tremia nervosa com a música e com os cânticos, recebeu o santo. Foi levada para a camarinha. Mas como ela não era “feita” da casa, ficou lá até que o santo a abandonou e foi pegar uma negrinha moça que também entrou para o quarto das sacerdotisas.

O orixalá era Xangô, o deus do raio e do trovão, e como desta vez ele tinha pegado uma “feita”, a negrinha saíu da camarinha vestida com roupas de santo: vestido branco e contas brancas pintalgadas de vermelho, levando na mão um bastãozinho.

A mãe do terreiro puxou o cântico, saudando o santo:

«… Endurô dêmin Ionan ê yê!

A assistência cantou em coro:

«… A umbó k’ó wá jô!

E a mãe do terreiro estava dizendo no seu cântico nagô:

«… Abram alas para nós, que viemos dançar»
  

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