O grupo foi-se dissolvendo... |
JUBIABÁ
Episódio Nº 46
E Filipe, o Belo, morreu
debaixo de um automóvel. Era também uma manhã clara e Filipe estava cada vez
mais lindo. Mesmo a marca de chicote que lhe ficara na cara lhe dava um ar de
aventureiro.
Arranjara uma gravata nova
e comemorava o seu décimo terceiro aniversário. Os outros riam e brincavam. Foi
quando no asfalto da rua, brilhou qualquer coisa como um diamante. Balduíno
enxergou e disse:
- Parece um brilhante…
Filipe, o Belo, se
alvoraçou:
- Ah! vou apanhar para pôr no dedo. É meu
presente de aniversário… Correu para o meio da rua. Viriato ainda chegou a
gritar para avisar da vinda do automóvel.
Filipe olhou rindo e foi o
seu último sorriso. Ficou feito um monturo, um bolo de carnes que ainda gemia.
Morreu com o sorriso que fizera agradecendo o aviso de Viriato.
O rosto não fora atingido
e era belo, radioso, rosto de príncipe. O corpo foi levado para o necrotério.
Veio uma mulher pintada e velhusca que dizia entre lágrimas:
- Mon chèri… Mon chèri…
E beijava o rosto de
Filipe, o Belo. Mas ele não via mais nada e não sabia que era sua mãe que
estava ali. Não sabia também que o grupo se reunira de novo para o seu enterro.
Veio o Sem dentes, veio
Jesuíno, até Cici veio não se sabe de onde. Só não veio Zé Casqui nha que era marinheiro e estava viajando.
A mãe de Filipe e as
mulheres da rua de Baixo levaram flores. E os moleques o vestiram com uma roupa
de casimira, comprada a um turco que vendia roupa feita a prestações.
Sòmente Viriato, o Anão,
que cada vez estava menor e mais curvo, ficou mendigando. Os outros se
distribuíram pela cidade em diversos ofícios, operários de fábricas,
trabalhadores de rua, carregadores do cais.
O Gordo foi vender jornais
porque tinha uma bela voz. António Balduíno voltou ao morro do Capa Negro, e
ficou malandreando com Zé Camarão, jogando capoeira, tocando violão nas festas,
indo às macumbas de Jubiabá.
Ia ao cais todas as noites
e ficava espiando o mar a caminho de casa.
LANTERNA DOS AFOGADOS
Quando seu António comprou
a «Lanterna dos Afogados» à viúva de um marinheiro que a montara há muitos
anos, ela já tinha este nome e, em cima da porta, ostentava aquela tabuleta mal
pintada, na qual uma sereia salva um afogado.
O marinheiro que montara o
botequi m desembarcara um dia de um
cargueiro e ancorara ali naquela, naquela velha sala negra do sobrado colonial.
Amara uma mulata escura
que fazia arroz doce para os fregueses e fornecia bóia aos trabalhadores do
cais do porto.
Porque chamara ao botequi m de «Lanterna dos Afogados» ninguém sabia.
Sabiam porém que ele naufragara três vezes e que correra o mundo todo.
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