Episódio Nº 105
Os pés estão doridos da
caminhada. Ele poderia ter dado uma surra única no Zéqui nha.
Pois ele não era o Baldo, o boxeur? Não derrubara tantos outros no Largo da Sé,
na Baía?...
Sim, ele poderia ter
derrubado Zéqui nha a socos. Mas ele
viera com uma foice. Homem não briga de foice e traição se paga com traição…
Por isso puxara o punhal e o deixara cair para cravar o outro nas costas de Zéqui nha.
E quem ganhara com tudo
isso fora Filomeno, que agora deveria estar na sentinela olhando para Arminda…
Ele mataria Filomeno se pudesse ir até casa de Zéqui nha.
O cadáver estaria
estendido no girau com a ferida nas costas. Filomeno pôs, com certeza seu
punhal no cinto e depois porá Arminda na sua casa. Ele devia ter matado era
Filomeno.
Agora estava encurralado
na capoeira, cercado de todos os lados. Se não fosse a sede que sentia tudo
iria bem… Mas a sua garganta está seca. Não lhe importam os pés doídos, o rosto
que sangra rasgado pelos espinhos, a roupa retalhada.
Só lhe importa a garganta
que arde de sede. Gostaria de comer também. Naquele mato não tem frutas. Não é época
de goiabas, as goiabeiras não têm um só fruto.
Uma cobra passa silvando.
Os grilos fazem um ruído insuportável. Agora ele não vê mais as estrelas que o
mato é cerrado. E a sede aumenta. Fuma. Felizmente os cigarros e os fósforos
estavam no bolso da calça.
Que horas serão?
Meia-noite talvez, talvez mais tarde. O cigarro faz esquecer a sede e a fome.
Desde quando ele fuma? Nem se recorda mais. Ainda no morro do Capa negro ele já
fumava. Apanhou por causa disto.
Se sua tia Luísa o visse
agora, o que diria? Ela dava-lhe surras mas gostava dele. Enlouqueceu, coitada,
de tanto carregar mingau e mungunzá para vender no Terreiro. Na frente da sua
casa, no morro, homens se reuniam para conversar.
Um dia veio aquele homem
de Ilhéus que contou histórias de jagunços corajosos. E hoje, António Balduíno,
estava encurralado como se fosse também um jagunço célebre. Se o homem de
ilhéus o visse, com certeza o admiraria também e juntaria a sua história
àquelas que contava pelas noites adentro.
Ele também qui sera ter um A B C. Pensara que aquele homem
calvo, que aparecera na macumba de Jubiabá, escreveria um dia o seu a B C.
O Gordo disse que a vida
do homem calvo era escrever os A B C dos homens mais corajosos que conhecia e
para isso vivia correndo o mundo montado num cavalo alazão. António Balduíno já
merecerá um A B C? Ele não o sabe.
Talvez que o homem de
Ilhéus conte um dia a sua história a homens e meninos de outro morro que o admirarão
e pensarão em ser como ele.
Ah! mas se ele sair desta
capoeira, onde está cercado por homens armados de repetição, merecerá ser
cantado num a B C. Quantos serão os perseguidores? Se vieram todos da fazenda
fazem mais de trinta.
Mas não vieram todos com
certeza. O negro Filomeno não veio, ficou lá com Arminda, dizendo mentiras,
prometendo coisas. Ele conhece aquele negro… Negro que quase não fala é ruim…
Aperta a navalha. Com aquela arma sómente, ele atacaria Filomeno se o visse
agora.
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