Episódio Nº 106
Diriam isso também no seu
a B C. Somente com uma navalha matou e atacou um jagunço que trazia uma
repetição… atira fora o cigarro inútil. Diabo, a garganta está seca, o estômago
dói e sente uma dor violenta no rosto.
Passa a mão e toca na
ferida feita pelo espinho. Agora que o sangue deixou de correr, ela está
doendo. É um talho grande, lanhou todo o seu rosto. Também os seus pés sangram,
as mãos estão feridas.
E a sede que o tortura, os
homens que o cercam, os grilos que fazem ruído… Vê novamente as estrelas agora
no mato ralo. Se ainda houvesse água… se chovesse. Mas não há nuvens negras no
céu. Somente farrapos de nuvens brancas que o vento carrega.
E a lua que saíu, a grande
lua alva que está bonita como nunca. Que vontade que ele tem de estar no cais
da Baía com o seu violão, com aquela mulher que tinha voz masculina, cantando
uma valsa, uma coisa bem velha que falasse em amor… Depois rolariam na areia do
cais, os corpos embolados…
Ah! como era bom. Aquela
estrela até parece a luz da «Lanterna dos Afogados». Beberia um trago, ouviria
a música do velho cego que canta ao violão, conversaria com o Gordo e o Joaqui m. Talvez até Jubiabá aparecesse e ele lhe
pediria a bênção.
Pai Jubiabá também não
sabe que ele está encurralado na capoeira. Não sabe que ele matou Zéqui nha. Mas Jubiabá compreenderia e passaria a mão
na sua cabeça e depois falaria em nagô.
Não, ele não diria que o
olho da piedade vazou, que houve somente o olho da ruindade… Por que ele havia
de dizer isso? António Balduíno ainda tem bem aberto o olho da piedade.
Matou Zéqui nha, matou… Mas foi porque ele estava andando com
uma menina de doze anos… Uma menina não era mulher feita… que pergunte ao Gordo
se qui ser. Uma menina, tão menina
que a mãe quando morreu tomava conta dela…
Pergunte ao Gordo, se qui ser… Mas é inútil mentir a pai Jubiabá. Ele sabe
tudo, que ele é pai de santo e tem força junto a Oxalá… Sabe tudo como a velha
defunta…
Não, ele matou porque
queria Arminda para ele… ela tinha doze anos mas já era mulher… O Gordo não
entende destas coisas… Como é que alguém pode acreditar no Gordo… O Gordo não
entende nada de mulheres, o Gordo só entende de rezas.
E, depois, o Gordo é muito
bom, não tem olho da ruindade. Pai Jubiabá deve é fazer um feitiço para matar o
negro Filomeno… O negro Filomeno é ruim, ele vazou também o olho da piedade…
Um feitiço para matar ele,
um feitiço forte que tenha cabelo de sovaco de mulher e penas de urubu… Porque
será que pai Jubiabá balança a cabeça? Ah! ele está dizendo em nagô que António
Balduíno também vazou o olho da piedade… Ele está dizendo, sim…
António Balduíno puxa a
navalha com a garganta seca de sede. Se Jubiabá repetir ele o matará também. E
depois passará a navalha no próprio pescoço. Vê, no céu azul o negro velho. Não
é a lua, não. É Jubiabá. Ele está repetindo, ele está repetindo…
E António Balduíno se
precipita de navalha em punho e quase bate nos perseguidores que estão
conversando na estrada.
Jubiabá desapareceu.
Balduíno tem sede. E volta correndo para o mato cerrado, onde não vê a lua, não
vê as estrelas, não vê o cais da Baía com a «Lanterna dos Afogados». Se estira
no chão, estende as mãos para o lado onde está a estrada:
- Amanhã eu mostro se não fujo… Eu sou é
macho… O rosto dói e ele tem sede. Mas quando cerra os olhos dorme logo e não
tem sonhos.
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