terça-feira, setembro 10, 2013

JUBIABÁ

Episódio Nº 107

Acorda com os passarinhos que trinam. Olha tudo em redor e não compreende como se encontra ali e não num girau nas plantações. Mas a sede que aperta a sua garganta e o talho que dói no rosto lembram-lhe os factos da véspera.

Ele está encurralado numa capoeira, ele matou um homem na véspera. E está com sede, uma sede doida. O rosto inchou durante a noite. Passa a mão no talho:

 - Espinho venenoso… Ainda essa porcaria…

Fica de cócoras pensando no que fazer. Talvez tenham deixado pouca gente no cerco durante o dia… O rosto dói. Tem sede. Sai de mansinho evitando outros espinhos e evitando fazer barulho.

Agora com a claridade do dia se orienta melhor. A estrada está à sua direita. Mas ele se dirige para a picada que deve ter menos gente. Se não fosse a sede ele não se importaria. Não sente fome agora. Só que o estômago está doendo. Mas é suportável.

A sede é que é ruim, parece que aperta a garganta como uma corda. Não ele precisa de passar nem que seja para ser preso. Já não pode de sede. Pode lutar até que lhe dêem um tiro que acabe com aquilo.

Engraçado é que ninguém gostava de Zéquinha e todos gostavam dele. Mas o patrão mandou, com certeza, e quem não for cercar o criminoso será despedido do trabalho… Se tiver gente na picada vai haver briga… Ele vai morrer mas levará um…:

 - Um vai com eu…

Ri tão alto que parece alegre. E está alegre sim, porque resolveu acabar com aquilo e lutar pela vida. A coisa que ele mais ama é brigar. Só agora é que o sente. Nasceu para brigar, para matar e um dia morrer com um tiro pelas costas, de uma navalhada talvez.

Os que voltarem contarão que ele morreu como homem macho de verdade, com a navalha na mão. E quem sabe se não contarão aos filhos e aos amigos a história de António Balduíno que foi mendigo, boxeur, fazedor de sambas, desordeiro, que matou um homem por causa de uma menina, e que morreu na frente de vinte, mas se defendendo’ Quem sabe?

Depara com a poça de água, bebe em grandes goles e lava a ferida do rosto.


Água! Água! E ele que nunca tinha reparado como a água era gostosa! Melhor que cerveja, melhor que vinho, melhor mesmo que cachaça. Que o cerquem agora, que o deixem encurralado como um cão. Que lhe importa!

Tem água para beber e para lavar a ferida do rosto que dói e está inchado. Se estira à beira da poça, e descansa confiante, sorridente, feliz. Durante a noite, com a escuridão ele não vira as poças de água. São várias, água barrenta, suja, mas gostosa como quê.

Passa muito tempo deitado, matutando. Quando fugir para onde irá? Poderá entrar pelo sertão, se acoitar numa fazenda, tratar de bois. Tem tanto assassino por aí… Se o perseguissem muito entraria num bando de cangaceiros e iria viver aquela vida que ele sempre admirou.

O pior é que agora está sentindo fome. Talvez encontre alguma fruta como encontrou água. Sai pelo mato examinando as árvores. Não encontra nada. Mas pelo correr do dia talvez mate um animal e o coma. Ele tem fósforos, fará fogo.

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