quarta-feira, outubro 23, 2013

FUTUROLOGIA



O difícil, aliciante e irresistível exercício da futurologia constitui uma actividade mental perigosa porque as previsões podem traduzir, mesmo inconscientemente, os nossos desejos, corresponder aos nossos interesses materiais ou ideológicos, condicionando e enviesando o comportamento dos outros na tentativa de “driblar” o futuro.

Jesus, por exemplo, confundiu os seus desejos com o futuro previsível e , naturalmente, enganou-se. Acreditou no fim do mundo e na vinda do Reino de Deus… por isso, ou por um simples desejo de justiça igualitária, alguns dos seus seguidores, os ricos, venderam tudo o que tinham, distribuíram  o produto da venda pelos pobres e ficaram em paz a aguardar o fim do mundo prometido pelo mestre.

Mesmo enganando-se nas previsões de fim do mundo, que não na sua mensagem de justiça e de amor, Jesus, terá sido o homem, que podendo ter passado ignorado como tantos outros messias do seu tempo  foi, no entanto, o que mais influenciou os destinos de toda a humanidade. Pela qualidade da sua mensagem reforçada pela coerência da sua vida e por outros factores e contributos aos quais foi alheio. Falhou como futurologista, acertou em cheio no impacto da sua mensagem.


Depois de Jesus Cristo, muitos outros têm previsto o fim do mundo (a mais apocalíptica das previsões) e, se continuarmos nesta senda corremos o risco de, com previsão ou sem ela, ele acabar mesmo, pelo menos tal como hoje o conhecemos.

Na realidade, todos os dias ele acaba: para os que morrem, para as espécies que desaparecem, para as paisagens que se alteram... mas isso já não é futurologia.



Menos perigoso, quase ingénuo ou inofensivo, é um outro exercício de futurologia que consiste em fazer previsões sobre aquilo que teria sido o futuro, entretanto já acontecido se  à partida a realidade tivesse sido outra.


 - Como teria sido a vida dos portugueses se dois dos políticos mais influentes após a revolução dos Cravos, em 1974, Francisco Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa, não tivessem morrido num acidente de avioneta na noite de 4 de Dezembro de 1980?

 - Como teria sido a minha própria vida se tivesse conhecido trinta anos mais cedo a mulher que só agora se cruzou comigo?


Perguntas boas porque não correm o risco de alguma vez serem respondidas...
Para além do prazer ou desprazer de estar vivo, esta especulação sobre a nossa vida, pode constituir um ponto de interesse da própria vida: exercita a imaginação, vai ao encontro dos nossos desejos, mexe com os nossos instintos de felicidade.


Há sempre razão, mesmo quando já não há razão nenhuma, para estarmos vivos: -  metermos-nos” com a nossa própria vida.


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