Episódio Nº 150
Os negros esqueceram tudo, as raízes de inhame, os
montes de tangerina, os abacaxis e os beijus. Querem agora é brigar, que brigar
é bom como cantar, como ouvir uma história, como mentir, como contemplar o mar
na noite de cais.
O Gordo furta uma garrafa de cerveja para o urso.
Alguém grita:
- Lá vem a
cavalaria.
Rápido como começou o barulho acaba. Os homens voltam
às suas barracas, aos seus montes de frutas e beijus. A cavalaria não encontra
mais nada, apenas um pouco de sangue no local.
Um homem tapa o talho que tem no rosto com o lenço. As
navalhas desapareceram. E os negros riem satisfeitos porque nesta noite já se
divertiram.
O homem do charuto diz a António Balduíno:
- Foi uma turumbamba dos diabos.
Oferece cerveja, alisa a cabeça do urso. A chuva cai
molhando os negros.
CRIOULÉU
O “Liberdade na Baía” ficava na rua do Cabeça, num
segundo andar servido por uma escada estreita. É uma sala ampla, cadeiras em
redor das paredes para as damas, um estrado onde ficava o jazz.
Há ainda um pátio de cimento com meses, onde é servida
a bebida, pois é rigorosamente proibido beber na sala de baile. Ao lado a
latrina.
O quartinho onde as damas arranjam o cabelo é bem
pequeno, mas tem um espelho grande e um banqui nho
para elas se sentarem. Tem também um pente e uma lata de brilhantina.
Nos dias dos grandes bailes – quando o carnaval se
aproxima ou se aproximam as festas do Bonfim – a sala fica engalanada com
flores e com fitas de papel de todas as cores.
Mas agora o que está próximo é o São João e do teto
pendem balões inúmeros e inúmeras bolas cheias de vento. Vai ser uma festa de
arrocho a de São João.
“O Liberdade na Baía” tem tradições a zelar e o seu
baile de Junho reunirá, sem dúvida, toda a criadagem das casas mais ricas,
todas as mulatas que vendem doces na rua, os soldados do 19, os negros que
estão espalhados na cidade.
É o criouléu mais célebre da cidade. Na Baía não são
muitos os criouléus. Os negros preferem ir dançar nas macumbas a dança
religiosa dos santos e só vêm aos criouléus nos dias de grande baile.
Mas “O Liberdade na Baía” conseguiu o apoio de Jubiabá
que ficou sendo presidente honorário e assim prosperou.
Demais tinha um jazz de barulho, que formara ali, mas
que andava ganhando dinheiro nas festas da cidade. Festa de gente rica sem o
«jazz dos 7 Canários” não prestava. E os negros até já vestiam smoking.
Porém eles davam tudo na festa do “Liberdade na Baía”.
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