segunda-feira, outubro 07, 2013

População brasileira
AS ORIGENS




DA POPULAÇÃO




BRASILEIRA




(“O Património Genético Português” – A história humana preservada nos genes – de Luísa Pereira, bióloga doutorada em genética populacional e Filipa Ribeiro licenciada em jornalismo)




O Brasil tem uma das populações mais heterogéneas do mundo por ter recebido contribuições dos grandes grupos populacionais: ameríndios nativos, colonizadores europeus (principalmente portugueses) e escravos africanos.

Na altura em que os portugueses chegaram ao Brasil, os ameríndios totalizavam 2,5 milhões de indivíduos, enquanto os portugueses eram apenas 1.500. O cruzamento entre o homem português e mulher ameríndia começou imediatamente, sendo frequente, e mesmo encorajado, após o terramoto de 1755, como medida para o crescimento populacional e a ocupação do país.

Se, por um lado, ocorreu esta diluição de linhagens ameríndias, maioritariamente femininas, na recém miscigenada população brasileira, por outro, as tribos ameríndias sofreram drásticos declínios devido a conflitos e doenças.

Recorde-se, por exemplo, que a epidemia de disenteria combinada com a gripe, em 1560, foi tão destrutiva como a varicela, em 1520 no México e no Caribe. Actualmente essas tribos reduzem-se a 326.000 indivíduos.

Os judeus perseguidos em Portugal também começaram a procurar refúgio no Brasil e, na impossibilidade de levarem as suas mulheres, cruzavam-se com as mulheres nativas, originando uma geração híbrida, os mamelucos, que ajudaram a alargar a influência portuguesa. De realçar que a palavra “mameluco” vem do árabe e designava os escravos que serviam como pajens, criados e soldados dos califas muçulmanos do Império Otomano; o termo pegou na América do Sul nos séculos XVII e XVIII, referindo-se a grupos de portugueses miscigenados ou não, que eram caçadores de escravos.

Normalmente, quando se fala nas origens da população brasileira, só nos lembramos de recuar até ao séc. XVI mas estudos recentes revelam a existência nas regiões do norte e centro, Amazónia, restos de complexos habitacionais semelhantes, em dimensão, às “polis” da Antiga Grécia.

Estas cidades, datadas de cerca de 1500, foram depois cobertas pela vegetação mas eram mais complexas em termos de planeamento do que as cidades europeias da mesma altura. A maior cidade deste complexo tecido urbano data de 1250 a 1650. O colapso surgiu por força das doenças resultantes dos contactos com os europeus que terá sido a causa provável da morte da maioria dos habitantes.

Os escravos africanos começaram a ser transportados para o Brasil a partir da segunda metade do século XVI para trabalharem nas plantações da cana do açúcar e, mais tarde, nas minas de ouro e diamantes e nas plantações de café.

Alguns dados históricos apontam para que, entre 1551 e 1850 teriam entrado no Brasil 8,5 milhões de subsarianos.

Quanto à emigração europeia para o Brasil, estima-se que entre 1508 e 1808 chegaram 500.000 portugueses. A partir desta data os portos brasileiros foram legalmente abertos e começaram a chegar emigrantes de outras paragens, tais como Itália, Espanha e Alemanha, embora os portugueses continuassem a ser maioritários.

Já no século XX, começou a emigração asiática, especialmente do Japão mas também da Líbia e da Síria.

Resumindo:

- Entre 1500 e 1972, 58% dos emigrantes chegados ao Brasil eram europeus, 40% subsarianos e 2% asiáticos.


Como era de esperar, o estudo da ancestralidade dos brancos brasileiros a partir das características moleculares do ADN mitocondrial mostrou-se bem diversa da que foi encontrada com os marcadores do Y, ou seja, a maioria das linhagens paternas é europeia, enquanto que a maioria das linhagens maternas (mais de 60%) é ameríndia ou africana.
Evidencia-se, assim, um padrão de reprodução assimétrico – homens europeus com mulheres indígenas e africanas, o que está de acordo com o que sabemos sobre o povoamento “pós-descobrimento” do Brasil.

Em 1552, em carta ao rei D. João, o padre Manuel da Nóbrega relata a falta de mulheres brancas no país e pede que elas sejam enviadas, para que os homens se “casem e vivam apartados dos pecados em que agora vivem…”

É certo que a coroa portuguesa permitia os relacionamentos entre portuguesas e índias desde o início da colonização e chegou mesmo a estimular os casamentos deste tipo ao promulgar um Alvará de Lei em 4 de Abril de 1755, da autoria do Marquês de Pombal cuja ideia era povoar o Brasil e garantir a sua ocupação territorial. No entanto, essa política bastante liberal para a época, não abrangia os africanos, apesar de, na prática, os relacionamentos entre portugueses e africanas terem existido e mesmo nas classes mais altas, como se pode ver em algumas novelas históricas.

Dos cálculos efectuados e considerando os 90.647.461 de pessoas classificadas como brancas no censo de 2.000, pode-se concluir haver 28 milhões de afro-descendentes entre os brasileiros autoclassificados como brancos.

Continuando esses cálculos, pode-se estimar que, do censo de 2.000, 61 milhões de brasileiros negros têm linhagens maternas africanas o que somado aos 28 milhões de brasileiros “brancos” que também apresentam linhagens maternas africanas, conclui-se que 89 milhões de pessoas, ou seja, 52% dos brasileiros são afro-descendentes por via materna e esta percentagem é muito superior aos 45% dos brasileiros que se declararam “pretos” ou “mulatos”.

Atentando a esta contribuição materna subsariana no Brasil, ainda hoje é possível identificar no património genético brasileiro de origem subsariana uma proporção considerável de linhagens provenientes da costa leste de África (rondando os 13%), muito mais elevada do que a proporção observada noutras regiões que receberam escravos, como Portugal.

De facto, a costa leste de África, especialmente Moçambique e Madagáscar, aumentou a sua importância como fonte de escravos desde que Portugal perdeu a possessão de Angola para os Holandeses em 1640.

Estes escravos eram principalmente direccionados para as colónias na América e o Caribe porque nessa altura a importação de escravos para a Europa já era muito reduzida, tendo a maioria dos países europeus proibido a entrada de escravos em meados do século XVIII. No entanto, a escravatura continuou para as colónias americanas, começando as pressões abolicionistas a fazer-se notar em inícios do século XIX, com Portugal a abolir o tráfego de escravos definitivamente em 1869 apesar da escravatura ter sido abolida em 1761.

Nas ex-colónias e mesmo no Brasil, para onde se dirigiram mais portugueses, é possível identificar uma maior miscigenação entre homem português e nativas/escravas, da mulher portuguesa e nativos/escravos.

Mas há um caso famoso que foi o do filho mais velho de uma escrava, Sally Hemings, cujo pretenso pai teria sido o Presidente dos Estados Unidos da América, Thomas Jefferson.

As análises ao ADN de pessoas familiares do Presidente e de outras descendentes da escrava, permitem concluir que o filho mais velho de Sally Hemings não podia ter sido gerado por Thomas Jefferson mas poderia ser gerado pelos seus sobrinhos. O filho mais novo de Sally Hemings partilhava a linhagem paterna do Presidente, o que, se não permite afirmar que tenha sido o Presidente a gerá-lo, não o exclui – o Presidente ou qualquer parente masculino poderia ser o pai.
Mas os tempos felizmente mudam – uma linhagem subsariana masculina está, finalmente, à frente da Casa Branca.

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