Episódio Nº 154
António Balduíno não gosta
de pensar nestas coisas. Ele gosta é de rir, de tocar violão, de ouvir as
histórias bonitas do Gordo, as histórias heróicas do Zé Camarão. Mas hoje ele
está aborrecido porque vai perder a festa de João Francisco. Tem que ir com
Rosenda ao baile n “Liberdade na Baía”.
Antes passará na casa de
Clarimundo que é no meio do caminho. Irá ver o morto que foi seu amigo. O
melhor era não ir a festa nenhuma, era ficar fazendo sentinela ao morto.
Ia falar com o pai Jubiabá
para que o feiticeiro fosse encomendar o cadáver. É bem capaz de Jubiabá estar
em sua casa, conversando com o Gordo. A casa do Gordo fica perto do morro do
Capa Negro e de vez enquanto Jubiabá desce para conversar.
Jubiabá não envelhece.
Quantos anos ele terá? Já deve ter passado dos cem. Também sabe tanta coisa.
Jubiabá aumenta a angústia que de quando em vez toma António Balduíno. Jubiabá
diz umas coisas que ficam dentro do negro e o fazem pensar no mar onde Viriato
se jogou, onde o velho Salustiano esqueceu a fome dos filhos.
António Balduíno pensa que
não é o mesmo, que não é tão alegre como antigamente. Agora pensa coisas
tristes. E ali mesmo, na rua, o negro ri alegremente, alto.
Transeuntes se voltam
espantados. O negro continua a rir. Mas compreende que está rindo mais para
irritar os outros do que por alegria. Continua a andar com o passo mole
apressado. Parece até que está correndo. Porém quando chegou a casa já ficou
calmo, e pensa na roupa branca que vai botar no baile da noite,
- Meu colar, benzinho.
António Balduíno olha para
a mulata com cara desconsolada. Só agora se lembrou do colar de Rosenda. Também
dez mil réis ficaram com Vicente para a mulher do Clarimundo.
A prata de dois mil reis
está no bolso. Rosenda faz um ar desconfiado:
- Você não trouxe meu colar?
- Você sabe quem morreu?
Mas não adianta porque
Rosenda não conhece Clarimundo.
- Eu tanto queria e você não trouxe… Só de
ruindade…
Depois diz que gosta de
mim. Mas deixe estar.
É véspera de São João e
todo o mundo está alegre na rua. António Balduíno gostaria também de estar
alegre. Os homens passavam por ele com as fisionomias risonhas e as casas de
fogos estavam cheias de fregueses.
Todos se preparavam para
uma noite feliz. Soltariam traques e estrelinhas. Os negros só conversavam
sobre a festa de João Francisco e sobre o baile do “Liberdade na Baía”.
No entanto António
Balduíno não pode ficar alegre esta noite. Clarimundo morreu e ele só pensa no
estivador. Rosenda está implicando fazendo-se de besta. Não responde às
perguntas do negro e começa a chorar.
Vai até à porta. Na casa
de Osvaldo levantam uma fogueira. Vai ser enorme. No sobrado defronte, moças
procuram o retrato do noivo numa bacia cheia de água.
<< Home