ou é bom que se saiba.
«A Grécia tem 11 milhões de
habitantes, a Europa do euro tem 332 milhões, o que dá 3,3 % de gregos. O PIB
da Grécia é de 330 biliões, o da Zona Euro de 12,5 triliões, ou seja, a Grécia
vale 2,5 %. Como é que cerca de 3% da população e da economia ameaçam a Europa
de forma tão dramática, ao ponto de andar tudo a dizer que o euro pode acabar e
talvez mesmo o próprio projecto europeu?
Outros dados ajudam a entender o sem
sentido desta história. A Grécia está para a Europa como a Madeira está para
Portugal. Jardim gastou e abusou, mas isso, apesar de agravar a situação
financeira do país, teve um impacto relativamente insignificante nas contas
públicas. O BPN, por exemplo, teve muito mais.
A Califórnia que tem um PIB
semelhante ao da Itália – e corresponde a 13,5 % na economia americana –, tem
andado à beira da bancarrota. Não passou pela cabeça de ninguém dizer que isso
significaria o fim dos Estados Unidos, afinal uma federação, ou que o dólar ia
desaparecer.
E já que estamos em maré de números,
os PIG, Portugal, Irlanda e Grécia, somam por junto 6,2% do PIB europeu.
Como se explica então que a Europa
ande que nem barata tonta devido ao mau comportamento de alguns dos seus mais
insignificantes membros?
A razão não é financeira, nem
económica. Desvarios e azares muito maiores têm sido resolvidos ao longo dos
tempos. A actual crise é exclusivamente política. Não tanto pela acção, mas
pela inacção.
Depois da crise do
"subprime" nos Estados Unidos, que começa em 2006 e explode em 2008,
em vez de se assumir que o "sistema financeiro" vigente não é
compatível com o desenvolvimento sustentado das sociedades e, pelo contrário, é
fonte de constantes crises, os governos preocuparam-se sobretudo em salvar a banca.
Injectaram rios de dinheiro,
aumentando brutalmente os défices, na convicção de que os bancos são o motor da
economia. Daí o "instintivo" pânico local com o BPN e o enorme buraco
herdado da operação.
Nesse processo, não se promoveu
qualquer alteração efectiva no comportamento dos "mercados" nem das
políticas, nada se aprendeu, e passado pouco tempo estamos perante nova crise,
desta vez das chamadas "dívidas soberanas". As quais no caso europeu
de soberanas têm rigorosamente nada, já que tudo está interligado.
Esta sucessão de eventos, cuja
consequência efectiva e imediata, é uma perda brutal de rendimento da
generalidade da população, sobretudo da classe média, e das pequenas e médias
empresas, deve-se exclusivamente a uma flagrante incompetência política.
Acossados pelo descrédito popular,
num ambiente de total subserviência aos interesses do capital, os políticos não
param de ziguezaguear e são mais parte do problema e do que da solução. A
política é hoje uma velha arte sem ideias nem futuro.
Acresce que não é só a política, e
com ela a democracia, que definha. Os Estados, por arrasto, são um alvo a
abater pelas boas e pelas más razões. Ineficazes, gastadores, clientelares, os
Estados consomem a riqueza e dão cada vez menos em troca. Por via
ideológica vão também perdendo a função de fiscalização e regulação essencial
para equi librar o interesse privado
com o interesse público. Por isso todos clamam, e eu também, pela diminuição do
papel do Estado. E os que defendem o contrário fazem-no com base numa visão
arcaica, deslocada no tempo e no modo.
O rescaldo de mais esta crise não
promete nada de bom. Não será, certamente, a construção de uma sociedade mais
livre, justa e sustentada. Com a política convencional paralisada não há também
que ter ilusões sobre os novos atores. O movimento global de indignação, que
revela uma grande vaga de descontentamento e raiva, de pouco valerá face ao que
objectivamente se desenha. Caminhamos para um mundo dominado abertamente (já o
é na sombra) pelas grandes corporações. Corporações que não têm mandato
democrático, não são escrutinadas e, em bom rigor, fazem o que lhes apetece em
prole do único objectivo que conhecem, lucros e mais lucros, cada vez maiores e
mais depressa, sem qualquer responsabilidade social. A democracia representativa
vai dando lugar a uma tirania financeira e corporativa.»
Jornal de Negócios
Autor:
Leonel Moura
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