segunda-feira, dezembro 02, 2013

Vocês não sabe nada...
JUBIABÁ

Episódio Nº 178


António Balduíno se recorda das plantações de fumo enquanto caminha na rua. Um homem passa encostado na parede. Segura a carteira por cima do paletó. Quem o visse diria que ele vai segurando o coração.

A cidade é envolvida pelos sons do batuque que vêm da macumba de Jubiabá. Hoje esses sons de batuque soam aos ouvidos do negro António Balduíno como sons guerreiros, como sons de libertação.

A estrela que é Zumbi dos Palmares brilha no céu claro. Um estudante certa vez se riu do negro António Balduíno e disse que aquela estrela não era estrela, era o planeta Vénus.

Mas ele ri do estudante porque sabe que aquela é a estrela de Zumbi dos Palmares, negro valente que morreu para não ser escravo, é Zumbi que brilha no céu e vê o negro António Balduíno lutando para que Gustavinho não seja escravo.

Aquele dia de greve fora dos mais bonitos da sua vida. Tão bonito como a fuga através do mato, furando o cerco dos capangas. Tão bonito como o dia em que ganhou o campeonato de boxe, derrubando Vicente. Mais bonito até.

Ele agora sabe porque luta. E vai assim depressa para avisar todos os negros que estão na macumba de pai Jubiabá.

Vai avisar a todos: ao Gordo, ao Joaquim, a Zé Camarão, a Jubiabá. Ele não compreende porque Jubiabá ainda não lhe ensinara a greve.

Jubiabá que sabia tudo, Zumbi dos Palmares, que é o planeta Vénus, pisca para ele do céu.


Será que Exu, Exu, o diabo, está perturbando a festa? Será que se esqueceram de fazer o despacho de Exu, se esqueceram de enviá-lo para bem longe, para o outro lado do mar, para a costa de África, para os algodoais da Virgínia?

Exu está teimando em vir à festa. Exu quer que cantem e dancem em sua homenagem, Exu quer saudação, Exu quer saudação, quer que Jubiabá se incline perante ele e diga:

- Ókê! Ókê!

Quer que a mãe do terreiro peça passagem para o santo:


                             - «Edurô dêmim Ionam ô yê!

Quer que a assistência repita em coro:


                               - «A umbô k’ó wá jô!


Exu não vai embora. É a primeira vez que aquilo acontece numa macumba de Jubiabá. Os sons do batuque escorregam pela ladeira e vão morrer lá em baixo nos becos da cidade grevista.

As feitas dançam. Os ogans olham espantados. António Balduíno penetra de manso na festa. Ele é ogan e toma seu lugar dentro do círculo das feitas que dançam. E com a sua presença Exu vai embora.

O Gordo diz que a festa é de Oxossi. Mas antes que o deus da caça venha dançar no corpo de uma feita, António Balduíno fala:


 - Meu povo, vocês não sabe nada… Eu estou pensando na minha cabeça que vocês não sabe nada…

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