A Grande
Revolução
O Homem do
Neolítico
As grandes revoluções são silenciosas, não acontecem
de um dia para o outro, os seus efeitos são irreversíveis, progridem no espaço
e no tempo e quanto mais ele passa mais eles se fazem sentir até que uma sociedade
diferente vai surgindo com um novo homem com a sua incrível capacidade de se
adaptar, transformar, arranjando novas soluções para resolver os mesmos
problemas de sobrevivência.
E acontecem porque um elemento novo,
um facto concreto que se revela de especial relevância se introduz no dia a dia
da vida das pessoas, ou imposto pela força dos condicionalismos naturais ou
adoptada por se mostrar de uma evidente vantagem competitiva, normalmente numa
associação das duas coisas.
A técnica do domínio e controle do
fogo pertence ao último caso. As suas vantagens eram de tal importância que a
sua adopção não só revolucionou a vida dos homens como, ela própria, esteve na
origem do próprio homem com outras capacidades e condições para se afirmar no
processo competitivo que é o da vida desta espécie única.
No primeiro caso, depois de dezenas
de milhar de anos do nosso antepassado, o Homem de Cro-Magnon, ter vivido da
recolha de tudo aqui lo que a
natureza tinha para lhe oferecer para além do que caçava e pescava com
técnicas cada vez mais aperfeiçoadas e eficazes, chegou a um momento em que as
condições ambientais, coincidindo há cerca de dez mil anos, com o fim da era
glacial, sofreram tais alterações que aquele estilo de vida teve que,
progressivamente, dar lugar a um outro num processo longo e demorado e que teve
como consequências o surgimento não só de uma nova sociedade mas também de
uma nova humanidade.
Talvez não tenha sido uma transição
desejada, talvez o homem do neolítico não fosse mais feliz que o anterior, o
nosso “avô” Cro-Magnon, mas não sendo possível continuar por força dos
condicionalismos naturais com o mesmo estilo de vida, manda o instinto de
sobrevivência que se procurem outras soluções e foi isso que aconteceu e, pouco
a pouco foi-se virando a página do livro da história da nossa vida e com que
consequências…
Será que a magia praticada nas grutas
que ele tão bem decorou produziu os seus efeitos?
Seja como for, no início dos tempos
pós glaciários, ele descobre que pode agir sobre a natureza e até, de certo
modo, apropriar-se dela conduzindo àqui lo
que o pré-historiador australiano Gordon Childe chamou em 1930, “Revolução
Neolítica”.
Esta expressão é exagerada a menos
que se olhe para ela com uma amplitude de vários milénios que começam há cerca
de 14.000 anos, de uma forma tímida, e se desenvolve efectivamente no Neolítico
entre 10 e 4.000 anos atrás.
Na realidade, o que tivemos foi um
modo de vida de caçadores recolectores que se vai modificando pouco a pouco
porque a vida de nómada atrás das grandes manadas de herbívoros já não se torna
possível porque elas começaram a escassear em consequência da diminuição dos
grandes espaços por onde circulavam.
E assim, preferem fixar-se durante
mais tempo em regiões cujos recursos conhecem bem, optando pela caça de animais
de pequeno porte abundantes nas redondezas das suas casas e começam a
interessar-se pelo ciclo das estações, pela influência destas sobre o
comportamento dos animais e pelo desenvolvimento das plantas selvagens que
aprendem a conhecer melhor e a utilizar mais amplamente.
Aos acampamentos ligeiros sucedem-se
agora verdadeiras pequenas aldeias feitas de cabanas robustas que permanecem
ocupadas, ao princípio, parte do ano e depois todo o ano pelos membros da tribo
que não são indispensáveis ao êxito das expedições de caça mais longínqua.
Este sedentarismo parcial, que tudo
leva a crer é acompanhado de mudança nas relações sociais dos grupos humanos,
modifica completamente a visão que o homem podia ter do seu meio ambiente e das
suas relações com o meio natural.
De um predador nómada torna-se
um”produtor” que se esforça por explorar de maneira mais intensiva um
território limitado nas proximidades do local de residência.
Desenvolve novas técnicas, domestica
animais, controla espécies vegetais, aperfeiçoa as aldeias e na sequência de
tudo isto assiste-se a um crescimento demográfico.
Do avanço registado nas armas uma
referência especial para o arco e flecha, fabricados com madeira, tendões e
tripa, que se espalham um pouco por todo o mundo pelas vantagens que
apresentavam por serem leves, de fácil transporte e mais eficazes do que as
lanças e os dardos a uma distância de trinta metros e mais adequadas a um
ambiente agora muito florestado.
Os arcos mais antigos foram
encontrados na Europa, na Dinamarca, e estão datados de há 8.000 anos e
pinturas talvez mais recentes, debaixo de uma rocha no Levante espanhol,
mostram caçadores equi pados com
arcos e flechas e grupos de arqueiros que combatem uns com os outros.
A cerâmica é um dos grandes
contributos do Neolítico embora desde há 25.000 que se tinha aprendido a cozer
misturas argilosas e em algumas regiões utilizavam-se também recipientes de
argila crua seca ao sol mas que eram muito frágeis e pouco práticos.
É natural que a técnica de entrançar
ramos, juncos ou bambus tenha sido praticada largamente muitos anos antes, ainda
no Paleolítico, mas a fragilidade do material não permitiu deixar vestígios.
Depois vieram os primeiros têxteis
tecidos com fibras de linho e pela mesma altura, 8.000 anos atrás,
generaliza-se no Médio Oriente o trabalho em cobre e na Suméria, há 5.500 anos,
inventou-se a roda.
O primeiro animal que compartilhou a
vida com o homem foi o cão cujos vestígios em acampamentos humanos foram
encontrados em jazidas datadas de há 14.000 anos tendo evoluído do lobo, coiote
e chacal e eram utilizados para a caça, para dar o alarme, para a guarda de
rebanhos e como companheiros.
O gato, a cabra e a ovelha aparecem
no Médio e Próximo Oriente há 10.000 anos. Os primeiros bovinos, os auroques,
foram “controlados" por caçadores que praticavam uma espécie de proto criação
de gado antes de serem verdadeiramente domesticados para se transformarem nos
bois actuais, primeiro na Grécia, há 8.500 anos e depois no Próximo Oriente.
Outros bovídeos foram domesticados
mais tardiamente na América, na África sariana e na Ásia e todos estes animais
permitiram aos homens melhorarem consideravelmente beneficiando, de modo
permanente, de leite fresco, queijo que pode ser conservado durante largo tempo,
de sangue retirado do animal vivo e, claro, de carne.
Outra fonte de produção de carne foi
o porco selvagem ou javali domesticado mais ou menos na mesma época, 8.500
anos, na Grécia e Próximo Oriente e alguns séculos mais tarde na Europa e China
Setentrional.
Mas o interesse do homem do Neolítico
estende-se por muitos outros animais que variam em função da região
considerada.
O cavalo é domesticado na Ucrânia há
5.500 anos, no Peru faz-se a criação de alpacas e lamas que provêm de
camelídeos selvagens dos altos planaltos andinos, de guanacos e vicunhas.
O burro, o camelo e o dromedário são
domesticados entre 5.000 e 4.000 anos, respectivamente no Próximo Oriente, no
Turquemenistão e na Arábia.
Mas a domesticação não se ficou
apenas pelos grandes animais. As abelhas foram exploradas pelos habitantes do
vale do Nilo há cerca de 5.000 anos e por essa mesma altura, o bicho-da-seda
era criado na China o que revela a antiguidade das actividades de tecelagem na
Ásia.
(continua)
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