Acontecimentos festejados madrugada adentro... |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 52
A voz recordava outra voz, familiar,
Mimi quase a reconheceu. Idiotice, como iria ser o Tenente Lídio aquele
mascarado? Obedeceu ao chamado, aproximou-se. Com a mão livre, o bandido
começou a tocar-lhe as carnes nuas, sentou-a no colo.
O desembargador sentia-se desmaiar, a
barriga desarranjada, súbitas cólicas incontroláveis.
Os outros chegavam do quarto com
Dorothy, um deles levava-lhe a mala. Mimi foi afastada do gentil bandido (o
mesmo perfume usado pelo Tenente Lídio Marinho, que engraçado!), e, de costas,
as armas apontadas contra o desmoralizado desembargador, os invasores ganharam
a escada e a desceram numa correria.
O
Desembargador Rufino murmurou:
- Preciso de um banho. . .
Carol, liberta da mordaça, atendeu ao
velho em primeiro lugar, havia esquecido, em seus bem traçados planos, ser a
terceira qui nta-feira do mês, dia do
desembargador. Despachou-o para o banheiro, acompanhado por Mimi, com sabonete
novo e toalha limpa.
Foi depois libertar Roberto, manteve com
o jovem médico longa conversa. Era melhor para sossego de todos que não mais
voltasse à Pensão Monte Cario e desistisse de vez de Dorothy.
Senão aqueles tipos sem entranhas, saídos
ninguém sabe de onde (“são os parentes dela.. .”, persistia Roberto em sua
opinião), podiam voltar, matá-lo ali mesmo ou no salão de danças, arruinando
para sempre o negócio e o conceito de Carol, em cuja casa jamais houvera
escândalo, pancadaria ou crime.
- Vou embora para o Rio no primeiro
vapor...
- E, enquanto espera, é melhor não sair
de casa... Deixou-lhe Roberto o dinheiro que levava consigo, não era muito mas
servia. Afinal era ele o responsável por aquela invasão, pelo susto do
desembargador - borrava-se todo o pobrezinho! - pelos danos morais sofridos
pela Pensão Monte Cario.
Quando circulasse a notícia, quem ainda
se atreveria a frequentar tão perigoso lugar? Roberto prometeu mandar-lhe
quantia maior antes de viajar. Apenas pedia a Carol para descer e examinar as
imediações, não tivesse ficado por ali na toca algum dos bandidos. Ela
regressou afirmando estar tudo calmo e ele partiu.
Ria-se ainda Carol, em sua cadeira de
balanço, quando saiu do banho o desembargador. Desejava ele também deixar
quanto antes aquelas temerárias paragens, mas como fazê-lo sem ceroulas? Se
vestisse as calças em cima da pele, iria pegar pelo menos uma gripe forte, quem
sabe uma pneumonia.
Carol emprestou-lhe rendadas calçolas de
uma das pequenas, magra e de pernas compridas. Riram ela e Mimi ao verem-no
assim ataviado e riu-se também o desembargador.
Aceitou um cordial após vestir-se e, se
bem recusasse ficar naquela mesma tarde - como iria conseguir alguma coisa após
o susto? - prometeu retornar na próxima qui nta-feira,
já convencido de que tal escândalo não voltaria a renovar-se.
Explicou-lhe Carol o sucedido como
consequência de antigas inimizades de Roberto agora para sempre com a entrada
proibida na Pensão Monte Cario. Mau elemento, concordou o desembargador,
pagando a Mimi o tempo e o banho, beijando a mão de Carol e pedindo às duas
segredo sobre sua mal cheirosa participação nos acontecimentos.
Acontecimentos festejados madrugada
adentro, ruidosamente, pelos amigos, os quatro habituais e mais outros cinco ou
seis cuja participação no rapto se fizera necessária para dar-lhe encenação
mais brilhante, a gosto do Comandante Georges Dias Nadreau.
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