Comandante sem cachimbo,a pitar não era comandante... |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 63
Não iria mais perder aquela mania de comprar instrumentos náuticos. Terminaria, vários anos depois, por ad
Tentara o germânico explorar o objecto na via
pública, cobrando um mil-réis de cada cliente interessado em olhar o céu de
perto, aproximar a Lua e as estrelas. Fracassada a tentativa, conta de pensão a
pagar, foi o telescópio para a casa da Rua dos Barris, de onde aliás projectava
o comandante mudar-se.
A sua peça predilecta, na colecção a
crescer, era a miniatura de um navio, o Benedict, de meio metro, reproduzindo
em seus mínimos detalhes um barco de passageiros, colocada dentro de uma caixa
de vidro.
Fora um presente de Jerónimo, no aniversário
de Vasco. O jornalista descobrira aqui lo
no porão do Palácio, a caixa coberta de poeira, jogada num canto como coisa
imprestável. Vasco delirou, não tinha palavras para agradecer.
Numa das suas longas conversas com
Giovanni, veio a saber ser hábito dos oficiais de bordo, sobretudo dos
comandantes, o uso do cachimbo.
Comandante sem cachimbo a pitar não era
comandante, na abalizada opinião do negro velho. No dia seguinte, Vasco surgiu
na roda atrapalhado com um cachimbo inglês, diabo difícil de fumar-se, apagando
a cada momento. Aprendeu com o tempo, não tardou a possuir vários, de matérias
e formas diferentes, de madeira e porcelana, de espuma-do-mar.
De quando em vez, no começo da tarde, ia
Vasco visitar o Comandante Georges Dias Nadreau, na Capitania dos Portos.
Envergava o uniforme de trabalho, o boné na cabeça, um cachimbo no queixo. Da
janela da Capitania olhava o mar, atento acompanhava a atracação dos navios.
Um dia foi apresentado, num bar, onde
esperava o coronel, a um senhor de Pilão Arcado. Ficaram os dois a conversar, o
Sertanejo encantado com aquelas relações citadinas:
- Então o senhor é comandante de navio?...
Mas de navio de verdade, não daqueles do rio que vivem encalhando... Deve ter
muito o que contar. Me diga uma coisa: o senhor já viajou lá para as bandas da
China e do Japão?
Pousaram-se no bronzeado rosto do homem
de Pilão Arcado os olhos inocentes do comandante:
- Na China e no Japão? Várias vezes,
sim, senhor... Conheço aqui lo tudo...
- E me diga uma coisa que tenho muita
vontade de saber: - o interesse jogava-o para a frente sobre a mesa - é verdade
que as mulheres de lá são peladas, só têm cabelo na cabeça, no resto nem um
fio, e que o xibiu delas é atravessado? Me contaram essa conversa...
- Mentira, andaram lhe bobeando. Não tem
nada disso. São como as de toda parte, só que mais apertadas, uma gostosura...
- De verdade? Como são? O senhor andou
com muitas?
- Uma vez em Shangai saí pela rua sem
destino... Num beco esconso deparei com uma chinesa chorando. Chamava-se Liú...
Acendiam-se os olhos do rude sertanejo,
enquanto o Comandante Vasco Moscoso de Aragão perdia-se nos mistérios de
Xangai, em vertigens de ópio, conduzido por Liú, uma chinesinha de laca e de
marfim.
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