quarta-feira, abril 23, 2014

Conseguiremos... Conseguiremos... Só que lhe vai custar uns cobres...
OS VELHOS
MARINHEIROS

Episódio Nº 62












- Não sou militar nem político, onde vou conseguir?

- Conseguiremos... Conseguiremos... Só que vai lhe custar uns cobres... mas vale a pena.

Jerónimo encarregou-se das negociações com o cônsul português, dono de uma pastelaria na Praça Municipal, para assim fazer-lhe sentir o interesse do governo naquela honraria ao Comandante Vasco Moscoso de Aragão.

- Mas não é o Aragaozinho, da firma Moscoso & Cia., do velho José Moscoso, ao pé da Ladeira da Montanha?

- Pois é o mesmo, sim, senhor. Somente agora ele é comandante da Marinha Mercante...

- Não sabia que houvesse embarcado...

- Não embarcou mas fez o concurso exigido por lei.

- Pois conheci-lhe muito o avô, um português às direitas, um homem de bem. E por que Sua Augusta Majestade lhe condecorará o neto?,
Jerónimo bateu a cinza do charuto, espichou o olho cínico:

- Pelos seus relevantes feitos marítimos...

- Marítimos? Que eu saiba...  Se nem embarcou...

- Ora, seu Fernandes, o homem paga, Sua Augusta e Arruinada Majestade condecorará o nosso bom Aragãozinho por uns ricos contos de réis...

E se outro pretexto não tivesse, lembre-se que ele se chama Vasco, é comandante, neto de portugueses, quase parente do Almirante Vasco da Gama...

Que diabo você ainda quer discutir? Invente os motivos, arranje a comenda, e depressa...

Assim, selou-se definitivamente a glória do Comandante Vasco Moscoso de Aragão quando, após alguns meses e cinco contos pagos adiantados, Sua Majestade D. Carlos I, Rei de Portugal e Algarves, outorgou-lhe o grau de Cavaleiro da Ordem de Cristo, antiga de 700 anos, vinda da época das Cruzadas, por sua “notável contribuição à abertura de novas rotas marítimas”.

Com medalha e colar, coisa de ver-se. A cerimónia foi simples e íntima, porém noticiada nos jornais e regiamente comemorada depois, com ginja e vinho português como mandava o protocolo.

Titulado, fardado, condecorado, não mais apareceu Vasco Moscoso de Aragão de crista caída ante o capitão dos portos. Sua alegria era total e esfuziante, jamais andara alguém tão feliz nas ruas da velha cidade da Bahia.

Dedicava agora grande parte de seu tempo a buscar nas casas de bricabraque (aliás existiam apenas duas em Salvador) objectos “marítimos, instrumentos de bordo. Pagava-os a qualquer preço.

Foi assim iniciando sua colecção de mapas, gravuras de barcos, sextantes, bússolas, relógios antigos. De uma viagem ao Rio, o Comandante Georges trouxe-lhe alguns instrumentos, de presente.

Enriqueceu-se de muito seu museu marítimo quando nas costas da Bahia, próximo à capital, naufragou um barco inglês. Foram os objectos a leilão, em hasta pública, e o maior lançador foi o Comandante Vasco Moscoso de Aragão.

Arrematou a roda do leme, uma preciosa luneta, cronómetros, agulhas magnéticas, anemómetros, higrómetros, o cronógrafo de bordo, uma escada de cordas, sem falar em duas caixas de uísque para oferecer aos amigos.

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