sábado, julho 19, 2014

Ou tá com medo?
TOCAIA GRANDE

(Jorge Amado)

Episódio Nº 5













3



Antes de deixar a fazenda, Natário examinara rifles e bacamartes, clavinotes e revólveres: armas de primeira, escolhidas a dedo, compradas a peso de ouro; bem azeitadas, em ponto de bala.

Fizera e refizera cálculos, disposto a evitar qualquer imprevisto.

Não podia permitir descuidos, tampouco depender de ajustes
duvidosos; afirmara ao coronel Boaventura que nem um único jagunço saído da Fazenda Cascavel prosseguiria na viagem para Itabuna, estavam em jogo sua palavra e a patente de capitão. O fazendeiro fora aguardar a notícia em ilhéus.

A chuva se prolongava há mais de uma semana. Nos caminhos
transformados em lamaçal, a marcha se tomava difícil, extenuante, cada légua valia por três. Na intenção de reduzir ao mínimo a demora na tocaia, Natário aguardara o anúncio da partida do bando armado pelo coronel Elias Daltro, para movimentar seus homens.

A notícia demorou a chegar pois os condenados abandonaram
o couto na Fazenda Cascavel com atraso de dois dias, esperando em vão que o temporal amainasse. Tendo as chuvas redobrado, não lhes sobrou outro jeito senão enfrentar a jornada naquelas péssimas condições: levavam pressa, tinham data marcada para chegar.

 Impaciente — a manhã ia alta—, o coronel Elias assistiu à partida, deu as últimas instruções a Berilo: em Itabuna deveria se apresentar ao doutor Castro, colocar-se às ordens.

Quanto ao percurso, Coroinha os guiaria: andarilho e caçador, vaqueiro experimentado, conhecia aqueles cafundós palmo a palmo, passaria longe das divisas da Fazenda da Atalaia.

 A expedição fora preparada debaixo do maior sigilo para que dela não chegasse anúncio ou consta aos ouvidos do coronel Boaventura ou de sua gente.

Exceptuando-se Berilo e Coroinha, os demais não sabiam para onde viajavam. Jagunços pagos para combater, não eram confidentes nem comandantes, quanto menos soubessem, melhor.

 -  O que é que tu tem, homem de Deus? — Indagou Berilo
a Coroinha quando, ao escurecer, se desviaram do caminho para enveredar pela trilha: — Tu tá vendo passarinho verde? Ou tá com medo? De quê?

 -  Tou pondo sentido para não perder o rumo.

Até podia ser. A lama desfazia o carreiro aberto pelo rastro
dos animais em direcção ao rio. Coroinha se abaixava, cheirava o chão, partia em frente. Cada passo custava esforço; no lombo, fardos de cansaço. Caititus e cutias atravessavam em disparada, cobras silvavam, jararacuçus e cascavéis.

Berilo acertara com o coronel Elias o sítio para o pernoite, do lado de lá do pontilhão; ia ser difícil cumprir o trato: a noite caía e ainda estavam perdidos naquela mata virgem, à mercê do tino do vaqueiro, cada vez mais acagaçado. Berilo pôs-se de sobreaviso, de olho no fuinha.

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