Pegaram o cara em flagrante
roubando galinhas de um galinheiro e o levaram para a delegacia.
D - Delegado
L - Ladrão
D - Que vida mansa, hein, vagabundo?
Roubando galinha para ter o que comer sem precisar trabalhar. Vai para
a cadeia!
L - Não era para mim não. Era para
vender.
D - Pior, venda de artigo roubado.
Concorrência desleal com o comércio estabelecido. Sem-vergonha!
L - Mas eu vendia mais caro.
D - Mais caro?
L - Espalhei o boato que as galinhas do
galinheiro eram bichadas e as minhas galinhas não. E que as do
galinheiro botavam ovos brancos enquanto as minhas botavam ovos marrons.
D - Mas eram as mesmas galinhas, safado.
L - Os ovos das minhas eu pintava.
D - Que grande pilantra... (mas já havia
um certo respeito no tom do delegado...)
D - Ainda bem que tu vai preso. Se o
dono do galinheiro te pega...
L - Já me pegou. Fiz um acerto com ele.
Me comprometi a não espalhar mais boato sobre as galinhas dele, e ele se
comprometeu a aumentar os preços dos produtos dele para ficarem iguais
aos meus. Convidamos outros donos de galinheiros a entrar no nosso
esquema. Formamos um oligopólio. Ou, no caso, um ovigopólio..
D - E o que você faz com o lucro do seu
negócio?
L - Especulo com dólar. Invisto alguma
coisa no tráfico de drogas. Comprei alguns deputados. Dois ou três
ministros. Consegui exclusividade no suprimento de galinhas e ovos para
programas de alimentação do governo e superfaturo os preços.
O delegado mandou pedir um cafezinho
para o preso e perguntou se a cadeira estava confortável, se ele não
queria uma almofada. Depois perguntou:
D - Doutor, não me leve a mal, mas com
tudo isso, o senhor não está milionário?
L - Trilionário. Sem contar o que eu
sonego de Imposto de Renda e o que tenho depositado ilegalmente no
exterior.
D - E, com tudo isso, o senhor continua
roubando galinhas?
L - Às vezes. Sabe como é.
D - Não sei não, Excelência. Me
explique.
L - É que, em todas essas minhas
atividades, eu sinto falta de uma coisa. O risco, entende? Daquela
sensação de perigo, de estar fazendo uma coisa proibida, da iminência
do castigo. Só roubando galinhas eu me sinto realmente um ladrão, e
isso é excitante. Como agora fui preso, finalmente vou para a cadeia. É
uma experiência nova.
D - O que é isso, Excelência? O senhor não vai ser preso não.
L - Mas fui pegado em flagrante pulando a cerca do
galinheiro!
D - Sim. Mas primário, e com esses antecedentes...
e respectivas equivalências
... Prof. DOUTOR ... preso ???... Nem pensar!!
Luís
Fernando Veríssimo
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