Lá se vem o rei da Babilónia... |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 51
Infatigáveis capetas, os meninos fuçaram
os casebres na ausência dos moradores: ninguém trancava as portas ao sair.
Não havia o que roubar, nada de valor, à
excepção dos instrumentos de trabalho de Lupiscínio e Bastião da Rosa, de algum
pertence do velho Gerino ou dos cabras sob suas ordens no depósito de cacau.
Fadul colocou o carpina de sobreaviso;
quanto ao louraça Bastião da Rosa, executava uma empreitada em fazenda próxima,
levara consigo os utensílios de pedreiro.
O número certo de crianças na caravana
jamais se soube.
Surgiam de repente, os pequeninos e os
grandalhões, imundos, remelentos, atrevidos, olhos de azougue buscando o que
surrupiar.
Inocentes, lindos, necessitados,
infelizes, as mãos estendidas, pedinchando. Mesmo não havendo o que
roubar, sumiram alguns teréns: um caco de espelho, uma faca sem cabo, o
cachimbo de barro de Gerino, a bruxa de pano de Nita Boa Bunda, miudagens.
Até a hora do crepúsculo quando a tropa
da Fazenda dos Macacos desembocou no descampado,
conduzida por Maninho com a ajuda de Valério Cachorrão, as raparigas constituíram
a única freguesia.
Sempre sobrava no cós da saia um cobre
de vintém, um níquel de tostão com que pagar a leitura da sorte na palma da mão
ou adqui rir um enfeite irresistível,
par de argolas, anel de vidro.
Foi mínimo, no entanto, o tráfico de
bijuterias, pois na venda de seu Fadu amontoavam-se sem
saída penduricalhos iguais ou mais bonitos. Contudo compraram uma ou outra
bugiganga, levadas pela lábia das ciganas, enfeitiçadas pelos olhos dos ciganos,
pelos olhos fundos de Alberto.
De volta do rio, Guta informara às
companheiras e rivais:
-
Chegaram de uma vez quatro reis da Babilónia, O mais mocinho é meu, fiquem sabendo, não se
metam com ele.
Um crepúsculo encantado, de
tangolomango. O sol pusera-se no fundo do tacho conduzido por Maurício, Alberto
desfolhava fantasias. A história da corte real da Babilónia, quem não a
conhecia?
Folhetim de entrega semanal, conto da
carochinha de boca em boca, cantiga de ninar:
Lá se vem o rei da Babilónia
Com sua corte real.
Lá se vem o rei da Babilónia
Dele vou me enamorar
Vou com ele me casar...
6
Alvoroçada freguesia para a buena-dicha
nas linhas da mão, murmurada ao pé do ouvido na meia língua das ciganas. As ciganas
nascem com o dom de adivinhar. Mesmo certas raparigas metidas a besta, que
juravam não acreditar em tratantadas e intrujices, estendiam a mão com a moeda
de vintém.
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