Quer casar com ela? |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 81
A seguir envolveu-se em acalorada controvérsia com Álvaro Faria sobre a política local. Aruza e Fadul trocaram algumas palavras, ele tentou interessá-la na Bíblia e no Alcorão, sem obter sucesso.
Ela não fazia sequer semblante de ouvi-lo,
mordia os lábios: estudante posta de castigo ou assustada donzela, ameaçada em
seus sonhos e projectos?
O olhar preocupado, dona Jordana, a mãe,
abria-se em sorrisos para o convidado; não deixou que o silêncio perdurasse e
Jamil o percebesse. Encontrou tema ao gosto de Fadul, os doces árabes: descreveu
receitas, discutiu detalhes de mel e gergelim.
Não era apenas gorda, era roliça, mas no
rosto ainda conservava vestígios de beleza. Há vinte anos passados, quando seu
pai Chafik lhe impusera Jamil em casamento e obediente ela aceitara, não havia
em Ilhéus begume mais sedutora.
Aruza saíra a ela na formosura mas herdara do
pai a firmeza e a teimosia.
Lá fora, na rua, alguém assobiava com
insistência trecho vivaz da “Marcha Turca”
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No caminho para a pensão de Tilde, à
cata das francesas, falsas porém supimpas, o non-plus-ultra
em matéria de refinamento, segundo Álvaro Faria, Jamil Skaf suspendeu o passo
e, tomando do braço de Fadul, nervoso, qui s
saber o que ele achara de Aruza.
-
Uma beleza, uma begume. Sem falar na educação.
Então, de chofre, o patrício perguntou:
-
Quer casar com ela?
Prosseguiu, a voz atropelada, quase
ofegante:
-
A Preferida vai de vento em popa, vou abrir uma filial em
Itabuna e botei roça de cacau no Rio do
Braço. Aruza é filha única.
-
Repetiu: — Quer casar com ela?
Indagação tão intempestiva, deixou Fadul
atarantado a ponto
de não prestar a devida atenção ao
protocolo da francesa que lhe coube. Mas depois, no quarto do hotelzinho de
Mamede, deu-se conta que
Jamil Skaf decidira escolher noivo para Aruza.
Que Jamil escolhesse noivo para a filha
e o impusesse, tratava-se de procedimento habitual, correcto e justo, digno de
aplausos.
Pai extremoso, preocupado com a
felicidade e o futuro de Aruza, assim agia para lhe assegurar lar abençoado,
vida tranqui la, contínuo bem-estar.
A
boa tradição, provada e comprovada, incontestada, mandava que os pais,
responsáveis pela sorte das filhas, elegessem entre os varões do reino ainda
solteiros o melhor de todos para lhe propor aliança e dote.
Uns poucos se descuidavam do dever
paterno deixando às donzelas suspirosas, levianas, imaturas, escolha e decisão
em assunto de tal monta.
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