sexta-feira, novembro 14, 2014

O império dos cornudos mansos
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 98



















Desmoralizado, Fadul estava lá em baixo, no fundo de um poço, enterrado na merda, cabrão, arkut apontado a dedo.

Abanou a cabeçorra:

 - Não sabia que ela era assim, vivo no mato.

- Eu não devia me importar nem me meter, não ganho nada com isso. Se fosse sabida me calava. Se tu casar com ela vai ser um ricaço cheio de dinheiro, pode botar casa pra mim, me tirar da vida.

 Fuad até me deu os parabéns, disse que tu vai ficar podre de rico... - um soluço escapou do peito contra a vontade de Zezinha:

 - ... podre de rico, fedendo, foi o que ele disse, tu tá me ouvindo?

Uma pausa na tentativa de conter o choro, a voz entrecortada:

 - Se tu casar com ela, nunca mais quero lhe ver. — Pôs-se a chorar.

Não mais tentou conter o pranto, segurar os soluços no peito, aguentar firme: Zezinha do Butiá cobriu o rosto com as mãos e deixou-se ir.

 Enxergando o brilho das lágrimas na face da rapariga, ouvindo-a soluçar por sua causa, indignada e triste por pensá-lo noivo de Jussara, rico e chifrudo, Fadul recobrou o ânimo, liberto do despeito e do vexame, reergueu-se, retirou-se intacto da raiva e da vergonha.

O bom Deus dos maronitas acudira a tempo. A Fadul já pouco se lhe dava fosse Jussara viúva honesta ou fosse a mais falada e fodida madama de Itabuna, não mais pensava em se casar com ela.

Importavam-lhe, isso sim e tão-somente, as lágrimas de Zezinha, o choro incontrolado, a mágoa, o despeito, a tristeza da coitada, sinais de bem-querer.

 - Quer dizer que era por isso que tu andava avexada? Não era doença nem morte de parente?

 - Tu pensa que não tenho sentimento?

A noite caíra inteira, manto de negrume. Na sala, Xandu acendeu um candeeiro.


8

Fiquei tentado, sim — confessou Fadul ao narrar a Zezinha 
do Butiá as peripécias da breve e maligna alucinação que quase o leva a amarrar o seu destino ao de Jussara Ramos Rabat, Jussa Pobre-de-Mim, ganhando ela marido e consideração, ganhando ele a mais bem provida loja de tecidos de Itabuna e o império dos cornudos mansos: Fadul da Mansidão.

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