quinta-feira, março 26, 2015

E o luxo da casinha para as necessidades.
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)





Episódio Nº 207

















Depois que a cerimónia terminou, a cadela e o cachorro ficaram engatados um ao outro; Nando quis jogar água em cima deles para desatar o nó mas Castor não consentiu: deixe que do resto a natureza se encarrega.

5

Pode-se afirmar mal comparando que o mesmo acontecera,
idêntico quiproquó, com o ferreiro Castor Abduim da Assunção e a sergipana Diva, ao menos no que se refere à maneira como ele a viu e ao modo como a tratou durante um ror de meses, mais de um semestre, e da sua surpresa quando, num dia igual aos outros, de súbito se deu conta da mudança.

Surpresa é pouco dizer para tamanho impacto: uma revelação. Um dia igual aos outros para o povo do lugar, não para o calçador de burros, siderado. Tampouco para a moça, esquiva e impetuosa que nem a cadela Oferecida ao entrar em cio e sangrar pelos lábios inchados da vagina.

Essas e outras coisas singulares que nos reserva a vida, enigmas, prodígios, maravilhas -  a natureza se encarrega de explicar e resolver. Assim ensinara o próprio Castor Abduim ao apressado Nando: não custa repetir conceito tão provecto e sensato.

6

Todavia quem primeiro se deu conta da transformação de Diva foi Bastião da Rosa, pedreiro afreguesado, cidadão de boa aparência, branco de olhos azuis, peça rara nas paragens, de alta cotação junto às mulheres, xodó disputado entre as raparigas.

Das casas, ainda contadas, de tijolo e telha, erguidas no Caminho dos Burros com materiais da olaria de Merência e Zé Luiz, a de Bastião da Rosa - José Sebastião da Rosa - era de longe a mais vistosa e confortável, o que se explica facilmente: trabalhando para si próprio, caprichara na solidez dos alicerces e na perfeição do acabamento.

Paredes azuis, janelas cor-de-rosa com parapeitos de madeira, calha por onde correr a água da chuva. E o luxo da casinha para as necessidades, no quintal; um buraco profundo e em cima dele uma caixa de madeira para nela o padecente se sentar. Como nas casas de Taquaras e de Itabuna.

A primeira Latrina de Tocaia Grande, conforto logo imitado por Castor e por Fadul. Coubera a Fadul porém a iniciativa de fazer cavar uma cacimba atrás do armazém, antes mesmo do grande poço que servia ao curral e aos tropeiros, benfeitoria do coronel Robustiano de Araújo.

Casa grande demais para um homem solteiro, murmurou-se em Tocaia Grande que Bastião da Rosa pretendia se casar, constituir família, correram boatos a propósito de noiva contratada em Itabuna, cidade de onde ele procedia. Lá deixara fama de rapaz namorador, incansável pé-de-valsa, destroçara corações de moças casadouras.

Site Meter